Família

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sexta-feira, 28 de março de 2014

SER DOENTE

Ontem, uma das minhas cuidadoras deixou que eu colocasse um short de pijama descosturado. Na hora de colocar a roupa, ela viu que o short estava descosturado e não me avisou, nem trocou a roupa. Eu só descobri o fato porque a minha sogra viu e me falou.

Eu fiquei muito brava e triste. Brava, porque a pagamos justamente para isso, cuidar de mim e o seu papel não foi cumprido. Triste, porque quando ela me disse que tinha visto o furo na hora de vestir a roupa e não tinha falado, nem feito nada, eu me senti péssima. Isso porque percebi um desleixo em sua voz do tipo "ela está doente mesmo, pode ficar com a roupa furada".

NÃO, NÃO POSSO!!! Antes de ser doente, EU SOU um ser humano. Não é porque estou acamada que preciso parecer uma mulambo. A minha auto-estima já está baixa, estou deprimida, e não devo ficar bagunçada. Nenhum doente deve! Baseada nessa minha experiência, peço que todos os cuidadores, pagos ou não, técnicos de enfermagem e parentes tenham atenção aos detalhes.  Mantenham a dignidade de seus pacientes. Deixem-nos limpos, com uma roupa boa, cheirosos e penteados.  Ah! Isso é importante... Não temos que ficar descabelados!

Nós agradecemos!!!

Beijos,
 
Dani.

segunda-feira, 24 de março de 2014

O DESAPEGO - Parte II

Não imaginei que o meu texto sobre o desapego fosse mexer tanto com as pessoas. Enfim, a minha intenção era mostrar a minha realidade e os meus sentimentos. Quando escrevo, tento ser a mais verdadeira possível. Como a verdade é minha, ela mexe comigo de maneira diferente. Por isso, eu confesso que não sei dimensionar o impacto dos meus textos nas pessoas. Mas fico feliz em saber que eles provocam emoções tão diferentes.

Continuando com assunto sobre desapego, essa palavra para mim é sinônimo de "não me importar mais": Outro processo difícil. Sempre fui muito exigente e perfeccionista. Todas as minhas coisas tinham que ser perfeitas, como boa virginiana. 

Com a doença, eu tive que tentar me desapegar dos meus perfeccionismos. Por exemplo, cuidei da minha casa até onde pude. Agora, eu simplesmente não me importo mais. Não me importo mais se a casa está suja, se a empregada não sabe passar roupa, se a técnica não sabe fazer minha mudança de decúbito... Eu não falo mais, então, tento não me importar se fui bem limpa, se o banho foi dado direito, se a medicação está certa... difícil demais. Parece que o perfeccionismo se impregna no nosso corpo como perfume ruim. 

Só para ver o nível da coisa... moramos dois anos na França, eu tinha uns quatro anos e, como qualquer criança, aprendi a nova língua rapidamente. Minha mãe conta que eu ficava corrigindo a pronúncia dela. Olha que chata! Como mudar um padrão de comportamento que existiu desde sempre?

Dependo 100% de outra pessoa e, para que eu não sofra, é necessário que eu confie no outro. Para que isso ocorra, é necessário que eu não me importe mais, só que na minha cabeça maluca, não confio em ninguém, nem no meu marido, por melhor que ele ou a minha equipe sejam. Sou privilegiada por ter uma equipe de enfermagem com cinco pessoas que me atendem. Elas são ótimas, super competentes, dedicadas e confiáveis, meu marido também é perfeito, mas eles não sou eu. E eu era imbatível!!! Desculpem a falta de modéstia. rsrss...

E aí, a verdade é que eu não consigo não me importar nem largar totalmente o meu perfeccionismo. Quando o assunto sou eu, eu me importo muito, principalmente se for relacionado ao meu conforto ou a minha qualidade de vida. Tento disfarçar para não ser tão chata, mas eu vejo a verdade, e para sofrer menos, fico quieta, no meu silêncio, sofrendo sozinha. Simplesmente, sei que preciso deixar para lá. Eu tento, eu tento!

Beijos,

Dani.

sexta-feira, 21 de março de 2014

O DESAPEGO

A ELA é uma doença cruel. Por causa dela, fui obrigada a praticar o desapego. O desapego começou com coisas pequenas. Primeiro, tive que abrir mão de lavar louça, fazer os bolos que tanto gostava. Depois, foi a calça jeans que não conseguia abotoar; daí comecei a usar calça de malha. Eu ainda trabalhava e precisava ir ao banheiro sozinha. Daí, a importância de usar uma roupa que eu conseguisse colocar e tirar sozinha. Não conseguia mais tirar a calça, então só usava vestido. Fiquei meses usando só vestido, sapatos abertos que não precisavam prender, os mesmos brincos, não usava bolsa porque não conseguia carregá-la, até parar de andar, depois de respirar e comer, enfim...  Fui abrindo mão da minha vida, de coisas que parecem pequenas, mas que juntas são gigantescas! A prática do desapego era uma constante e foi necessária muita coragem para viver. A cada desapego, uma tristeza. Tento aprender a viver uma vida que tira mais que do que dá.

Eu costumo dizer que por pior que seja, se desapegar de coisas materiais é até fácil quando comparado ao desapego das pessoas. O amanhã a Deus pertence, mas o meu amanhã é certo, só o tempo é incerto. E por isso, eu sofro. Sofro por saber que não acompanharei o crescimento dos meus sobrinhos, que nunca mais irei à casa da minha mãe, sogra e amigos. Quando meu irmão caçula se casar, eu não estarei lá. Sofro pelo sofrimento do meu marido e dos meus pais. Sofro pela vida que escolhi.

Eu não aceito todo esse sofrimento e, por não aceitá-lo, sei que sofro mais, porque sei que a aceitação traria a paz que tanto busco... Por isso não consigo alcançá-la.

Beijos,
 
Dani.

quarta-feira, 19 de março de 2014

SÓ AMAR NÃO BASTA

A doença sempre traz algo de bom. Para mim, ela fez com que me aproximasse de uma religião e acho que comecei bem: fui estudar a doutrina espírita. A doutrina me ensinou muito. Antes, eu achava que o fato de não ser uma pessoa má, já me fazia uma pessoa boa, de bem. Quanto engano!!!

Descobri uma coisa chamada caridade e ainda, que para praticá-la e ser uma pessoa boa, do bem é necessário ação, atitude. Ou seja, nunca pratiquei a caridade. Não tinha tempo!!! Que absurdo! Hoje, eu sei o que é caridade na prática porque tenho pessoas que de estranhas passaram a amigas e dedicam seu tempo a mim.

Acredito que a maior caridade que podemos fazer por alguém é doar o nosso tempo. Poucos somos os que doam um dos nossos bens mais valiosos. Eu não fazia. E agora, que preciso e desejo o tempo do outro, eu percebo que as orações são ótimas e bem vindas, mas só elas não bastam. Ser amada é ótimo, mas, só amar não basta. É necessário ações que na maior parte das vezes são simples.

Um paciente acamado precisa ter a família bem perto, de doçura na voz, de paciência, de nenhuma cobrança, de carinho, de presença, de dedicação do tempo, principalmente. Sei que é difícil para todo mundo, mas se há amor, não há como a vida dos membros da família continuar igual. Isso só acontece onde não há amor, pois a doença é cruel com a família também. Todo e qualquer paciente precisa ser amado, mas o amor sem outras atitudes e sentimentos não basta. Só o amor e a caridade na prática podem salvar um doente de problemas emocionais e até dos físicos. Não há remédio melhor que esses. Nem melhor desabafo para um doente que vive com o som do seu silêncio!

Beijos,
 
Dani.

quinta-feira, 13 de março de 2014

AGRADECIMENTO

Olá pessoal!
Quando fiz o blog, tinha a intenção de compartilhar o meu dia-a-dia e os meus pensamentos malucos de um paciente com ELA. Mais do que isso, a minha pretensão era, além de tentar ajudar alguém, ocupar o meu tempo.

Quanta ignorância e orgulho!  Quem está aprendendo e se emocionando por aqui sou eu. Como não pude ver o óbvio? Era certo que a maior beneficiada com o blog seria eu mesma. Tenho aprendido tanto com cada comentário que me sinto pequena diante da grandeza das palavras de vocês.

Obrigada, obrigada e obrigada!!

Ouso pedir a vocês que continuem a me presentear com suas palavras.

Beijos,
Dani.

quarta-feira, 12 de março de 2014

TRABALHAR É PRECISO

Sinto falta das pessoas inteligentes corporativas. Não sei se alguém da Brasil Telecom Call Center acompanha o blog, mas MORRO de saudade de lá. Até dói. Apesar de toda pressão e todo estresse, eu adorava aquilo. Era movida a desafios e todo dia eu tinha um. A minha equipe era muito unida; não existia sacanagens ou invejas. Todo mundo se ajudava. Mas não era moleza não. A minha coordenadora era dura na queda, às vezes me dava raiva. Depois a raiva passava e eu entendia e concordava com sua postura e seus motivos. Aprendi muito  com ela. E o nossos almoços? Eram memoráveis! Eita povo que gostava de comer bem. Depois disso tudo, ainda tinha o café na Livraria Cultura do Casa Park.

Sinto falta de discutir e, às vezes, até quebrar o pau com o pessoal da área de projetos. Todas pessoas boníssimas. E quando tinha aniversário de alguém de outra equipe, a comemoração quase sempre era no restaurante de comida mexicana que tem no final da Asa Sul - uma região de Brasília. Confesso que nós do RH já estávamos enjoados do restaurante rsrsrs...  mas íamos pelo companheirismo.

À medida que a doença foi piorando, eu tive que me afastar pelo INSS para me tratar. A expectativa era que eu voltasse em um mês, mas sabia que nunca mais voltaria. Depois de alguns meses de licença, tomei a iniciativa e fui buscar as minhas coisas mesmo sem ser provocada, pois eu sabia que seria difícil para a minha coordenadora me ligar e pedir que eu o fizesse. E já que tinha que ser feito, fui  lá e recolhi tudo, com muita tristeza, é claro. Não citarei nomes, para não correr o risco de esquecer ninguém. Trabalhei até o limite e se assim o fiz, foi graças ao pessoal da minha equipe que fazia o papel dos meus braços - colocavam e tiravam o meu casaco, faziam rabo de cavalo no meu cabelo e me ajudavam com o almoço, dentre outras coisas. Serei eternamente grata por isso. 

Sinto-me privilegiada pela oportunidade de trabalhar em um lugar em que realmente gostava. Fui muito feliz lá e isso é o que  importa!!!

Beijos,

Dani.

domingo, 9 de março de 2014

O SOM DO SILÊNCIO

Sempre fui faladeira, daquelas alunas que ficavam o tempo todo conversando em sala de aula. Sempre gostei de falar e de gente. Não foi à toa que me formei em psicologia e fui trabalhar com recursos humanos. Aprendi várias formas de comunicação, mas, a comunicação verbal, pelo menos para mim, é uma das formas mais rápidas e talvez mais eficaz de comunicação.

Desde que nascemos, aprendemos a utilizá-la de modo eficaz. É choro de fome, de manha, de sono e a mãe consegue distinguir todos os tipos de som emitidos pelo seu filho. E assim crescemos, desenvolvendo a fala.

No contexto da minha doença, meu maior medo é a perda da fala. Como seria a minha comunicação? O piscar de olho diante de uma folha de papel com o alfabeto escrito não é suficiente para quem tem tanto gosto e tanta necessidade de fala.

E agora que a minha voz está indo embora, só me sobra o desespero e o som do meu silêncio. Quando tento participar de alguma conversa e as pessoas não entendem o que balbucio, ou quando não consigo falar nada, eu me desespero e percebo que o som do meu silêncio para os outros é somente a ausência de barulho, mas, para mim, o som do meu silêncio é ensurdecedor, pois a minha voz grita e meus pensamentos ecoam em minha mente.

Sobre esse assunto, indico o filme "O Escafandro e a Borboleta". Vale a pena e gostaria de feedback depois!

Beijos,

Dani.

sexta-feira, 7 de março de 2014

COMO SABER?

"Como será o amanhã?
Responda quem puder
O que irá me acontecer?
O meu destino será 
Como Deus quiser
Como será?"
Simone


Sempre fui uma adolescente e uma mulher comportadas. No quesito drogas, rock'n'roll e homens, nunca dei trabalho para os meus pais. Tanto que eu tenho uma prima cuja mãe só deixava a filha sair comigo porque assim achava que ela estaria longe das más influências. Odiava esse rótulo!!! Mas eu era assim. Na minha quadra, era conhecida como a santinha do 101 - número do apartamento onde morava.

Era moça para casar. Eu dizia que queria casar virgem! Hahaha... Nunca fui de beijar muita boca, até porque tinha nojo e medo de pegar herpes.  Só tive dois namorados: com o primeiro, namorei quase sete anos; com o segundo me casei. Nunca fumei maconha ou cheirei lança perfume. Sempre odiei cigarro.

Hoje, deitada nessa cama, eu me ARREPENDO DE TUDO QUE NÃO FIZ. Devia ter beijado mais, depois tratava da herpes, se fosse o caso. Devia ter fumado maconha e  ficado doidona pelo menos uma vez na vida. Imaginem quantas vezes eu poderia ter me apaixonado e me desapaixonado naqueles sete anos de namoro com o meu primeiro namorado! Provavelmente, teria sido mais feliz. Como saber? Na fase de experimentações, eu não  estava experimentando. E agora, que tão jovem perdi a vida, tenho lembranças e saudades de coisas que nunca fiz. E se nunca fiz é porque achava errado. Ah, se eu tivesse coragem, como teria sido? E se eu tivesse sido outra pessoa, teria tido esse fim? Como saber?

Beijos,

Dani

segunda-feira, 3 de março de 2014

QUEM É CAPAZ?

Capacidade, para mim, é a habilidade de produzir algo, muitas vezes ir além do limite. Nós todos somos capazes. Não há limites para o ser humano.

Incapaz é aquele que não acredita em si mesmo. Esse é incapaz mesmo. Pensa pequeno. Como sempre pensei grande, eu sei que sou capaz, apesar de todas as minhas limitações.

Meu cognitivo funciona perfeitamente, todo conhecimento acumulado nesses 37 anos e minhas lembranças estão aqui. E nesse contexto, a paralisia do meu corpo fica em segundo plano, porque com a minha mente eu posso ir longe. Basta querer.

Você que tem alguma limitação, acredite!! Você é CAPAZ! Incapaz é quem não acredita na nossa capacidade.

* não estou levando em consideração a parte jurídica, que me define como incapaz por causa das minhas limitações.

Beijo,

Dani