Família

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segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Recomeçar

Não sou santa, nunca fui santa e nunca serei santa. Sou uma pessoa cheia de defeitos e qualidades como qualquer outra. A doença não me faz santa, mas com certeza me faz uma pessoa melhor porque me faz repensar minhas crenças e valores. Independente de qualquer coisa, idosos, doentes e pessoas acamadas merecem um cuidado especial. Afinal, são pessoas que não conseguem se defender das maldades do mundo.

Olhem a minha situação. Eu não mexo nenhum músculo do meu corpo. Nenhum mesmo. Dependo de um aparelho para respirar. E todo dia eu sou obrigada a recomeçar. Eu digo que sou obrigada porque há momentos em que não quero recomeçar. Há dias em que eu queria apenas esperar a morte chegar. Mas como eu sempre opto pela vida, eu também sou obrigada a superar esse momento. E a cada perda, física ou emocional, eu tenho que recomeçar.

Infelizmente, o meu recomeçar está sempre relacionado a uma perda, nunca a algo positivo. E por mais que eu recomece, eu nunca vou ter uma vida "normal". Eu recomeço para me manter viva, para sobreviver. Eu tive que redefinir alguns sonhos e desistir da maioria. Para sobreviver, eu criei outros projetos de vida. E hoje eu penso : se, de certa forma, eu consigo recomeçar, todo mundo consegue. Basta ter fé e acreditar em si.

Desejo que nesse recomeço de ano, você pense nisso. Independente dos seus problemas, tenha coragem de recomeçar pelo simples fato de estar vivo. Afinal, toda vida é preciosa e é um presente de Deus.

Feliz ano novo. Feliz 2016!!

Obrigada.
beijos.
Dani

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Responsabilidade II

Eu já escrevi sobre responsabilidade uma vez. Mas agora, o foco é outro. Gostaria de compartilhar com vocês a responsabilidade que é escrever um blog. O pior é que depois de quase dois anos, eu fui me dar conta somente agora dessa responsabilidade.

Todos os dias eu tenho a noticia de que alguém que não conheço está lendo meu blog, seja por mensagem ou por alguém que me conta. Mas a última notícia que tive, me deixou muito orgulhosa, mas também receosa porque me abriu os olhos para a responsabilidade do que escrevo. Afinal, atualmente, todo mundo tem acesso a internet e ao meu blog.

Vou contar o que aconteceu. Alice, uma menina de 9 anos, estudante de uma escola da Ceilandia (bairro aqui do DF)  e filha de uma colega de trabalho de uma amiga minha teve um trabalho de escola para fazer. O trabalho era para indicar uma pessoa com deficiência que se destacava na sociedade.

Sabem quem ela escolheu???  Eu, euzinha mesmo. Ela disse que eu me destacava na sociedade porque eu mudava as vidas das pessoas com o que eu escrevia no blog.  Minha amiga trouxe o trabalho para eu ver. Uma gracinha. Ela imprimiu minha foto e o texto que ela mais gostou (Escolhas http://daninepomuceno.blogspot.com.br/2015/09/escolhas.html).

Enquanto os colegas escolheram pessoas públicas, ela escolheu alguém desconhecido como eu. Nem preciso dizer o quanto fiquei feliz e orgulhosa com isso. É um privilégio poder ajudar alguém de alguma maneira,  estando na condição que estou. É muito bom se sentir útil apesar de tudo que passo.

Enquanto isso, meu blog, sem pretensão nenhuma, vai dominando o mundo!!!  Kkkkkk Agora com mais responsabilidade!!!

E a Alice, tão jovem, nem sabe que quem mudou a minha vida foi ela. Obrigada, pequena e precoce Alice.

Obrigada
Beijo
Dani

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Moradia e Qualidade de vida

Não há lugar melhor no mundo que nossa casa.  Com toda certeza,  o lugar onde moramos reflete nossa qualidade de vida.  Seja pelo conforto,  pela distância do trabalho ou simplesmente por ser o nosso cantinho.

Quando construimos minha casa, eu já estava doente. Não sabíamos o que eu tinha, mas mesmo assim, eu pedi para fazer a casa adaptada.  Meu pedido foi negado e dois anos depois, diagnosticada com ELA e na cadeira de rodas, tivemos que reformar a casa.  Por um lado foi bom porque na época eu era paciente do Hospital Sarah e a equipe de lá nos orientou na reforma, Inclusive com visita técnica multidisciplinar.

Foi então que tive qualidade de vida. Atualmente, eu posso frequentar qualquer ambiente da minha casa. Isso não tem preço. Meu quarto não tem janela, ele tem uma porta que dá direto para varanda. Isso facilita meu deslocamento pela casa e o acesso da ambulância porque tem um portão do lado do meu quarto que dá direto para a rua. Além disso, eu consigo ver a varanda,  a piscina e  as pessoas quando estou deitada na cama. Ainda tem meu banheiro todo adaptado que é espaçoso e arejado. Com ele,  eu tenho mais conforto no meu banho. Enfim, por melhor que fosse um apartamento, ele jamais me proporcionaria tanto bem estar e  qualidade de vida como a minha casa. Afinal, ela foi adaptada pensando em todas minhas necessidades. Para um deficiente físico ter todas essas oportunidades de deslocamento, conforto e vida é muito importante porque aumenta nossa expectativa e qualidade  de vida. Esqueci de falar da Nina, minha cadela, que torna meus dias mais felizes e é parte essencial no meu tratamento. Quando nos mudamos para casa, meu marido não queria cachorro porque ele já havia tido alguns e eles davam muito trabalho. Realmente, ele estava certo. O trabalho é enorme, mas é recompensador. É uma delicia ter cachorro.

Tivemos muita sorte na hora de mobiliar nossa casa porque ganhamos muita coisas.  Ganhamos móveis aleatórios que juntos combinaram e deram certo. Pelo menos, eu adoro a decoração da minha casa. Uma das minhas tias materna nos deu as 4 mesas e 16 cadeiras que ficam na varanda,  2 sofás de 2 lugares, uma mesa de centro,  uma mesa lateral e uma oratória. Uma outra tia materna nos deu a mesa da cozinha, com 6 cadeiras e 2 cadeiras de ferro. Meus pais nos deram o fogão da cozinha,  um freezer,  a geladeira da churrasqueira, um sofá de 2 lugares, a mesa de jantar, uma mesa de centro e uma mesa lateral . Minha sogra nos deu uma cama de solteiro. Apesar da mistureba, a decoração deu certo,  ficou aconchegante e a minha cara.

Na verdade, não importa como é a nossa casa, se ela tem mobília, se É bem localizada ou não. O que importa é que ela é o nosso refúgio. É o lugar onde podemos ser nós mesmos. Onde nos despimos de nossas máscaras. Por isso, eu sempre falo, só quem sabe o que acontece em uma casa é quem mora lá. Você pode frequentar aquela casa e mesmo assim não saberá os segredos daquelas paredes. Isso é bom. Afinal, precisamos de um lugar assim.

Desejo que sua casa seja mais que um amontoado de paredes e mobília. Para ter qualidade de vida em nossa casa, ela precisa ser um lar repleto de pessoas que se amam e se respeitam.  Desejo isso a você, amigo leitor.

Um agradecimento especial as minhas duas tias maternas, aos meus pais e a minha sogra pela ajuda .

Obrigada.
Beijo.
Dani.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

A solidão

O título deste post ia ser "a solidão da doença". Mas eu pensei quão egoísta eu seria em falar somente da doença fazendo parte de uma sociedade em que impera a solidão.

Você pode me achar radical na minha opinião, mas, no fundo, somos seres solitários. Acredito nisso, primeiro porque somos todos egoístas na nossa essência. Preocupamo-nos muito pouco com o nosso próximo. Segundo porque, na maioria das vezes, o que recebemos é menos do que esperamos ou achamos que devemos receber e terceiro porque tem gente que não nos oferece nada mesmo.

Nós nascemos, vivemos e morremos sozinhos por mais que estejamos cercados de pessoas que nos amam. No final das contas, somos somente nós e Deus e pobre daquele que não acredita Nele. Vai ficar mais solitário ainda.

E na busca desenfreada para suprir a carência da solidão, nós consumimos cada vez mais e mais. O pior é que somos incentivados a consumir e se não obtemos aquele objeto desejado, nós sofremos. E achamos que o sofrimento é porque não conseguimos a roupa ou a viagem da moda, sem nos dar conta que é algo muito mais profundo. Passamos a valorizar o ter em detrimento do ser. Passamos a valorizar o supérfluo e esquecemos das relações... esquecemos do outro. E aí vem  depressão porque as relações se tornam superficiais. Ao invés de estarmos com o outro, nós ficamos, apenas, ao lado do outro. E aí nós vemos bares, restaurantes e lanchonetes lotados de pessoas solitárias que, muitas vezes, estão acompanhadas, mas não trocam nenhuma palavra.

Se a solidão da vida já é triste, imagina a da doença! Uma vez, ouvi de uma pessoa que amo muito, que ela não podia carregar a minha cruz. Eu chorei muito ao ouvir isso porque entendi que estava sozinha por mais que tivesse pessoas maravilhosas e que me amassem a meu redor. Realmente, a cruz é minha. Ninguém pode carregá-la por mim... por mais que eu queira!

Uma vez eu tive uma crise de falta de ar. Eu estava na sala, na cadeira de rodas. Enquanto a técnica e cuidadora  me socorriam com ambu e aspiração, uma das pessoas que estava ao meu lado não tirava o olho do celular e a outra estava  preocupada em comprar pão. Nesse momento, eu entendi que estava sozinha. Aos meus olhos eu queria tão pouco. Só queria que pegassem na minha mão para que eu tivesse confiança e segurança de que sobreviveria a mais uma crise. Mas a solidão se fez presente.

Há outra situação que vivencio. Como eu não falo e a comunicação está mais difícil, ninguém consegue ficar comigo por inteiro, por simplesmente me fazer companhia. As pessoas só conseguem ficar comigo se estiverem conectadas ao celular ou ao tablet. O que eu faço? Fecho meus olhos e me recolho a solidão da minha doença.

Não há lugar mais solitário que um leito de UTI. Não há pessoa mais solitária que uma mãe que quer poupar os filhos da doença dela.

Enfim, eu teria inúmeros exemplos para citar para vocês. Mas seja qual for o motivo da sua carência, lembre-se de sempre optar pela vida. Seja qual for o seu sofrimento, opte pela a vida. Sempre vale a pena. Isso pode não resolver os seus problemas, mas te colocará no caminho para a solução. Ao optar pela vida, lembre-se do seu próximo e de que sempre há alguém pior que nós. E para viver em paz, diminua a sua expectativa em relação ao outro e perdoe. Afinal, quem te ama sempre dará o melhor de si, por mais que pareça pouco para você! Ah, reze pelo seu próximo e aproveite a vida com tudo que ela tem.

Viva a vida!
Obrigada!
Beijo.
Dani.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Fé e Esperança

  1. O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará.
  2. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas.
  3. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome.
  4. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.
  5. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda.
  6. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do SENHOR por longos dias. Salmo 23
Todo dia, eu rezo este salmo e descobri que rezo mais com esperança do que com fé.

Aliás, fé e esperança são dois conceitos confusos no meu ponto de vista. As religiões misturam, fundem as duas coisas. Mas lendo o evangelho de Jesus e compreendendo o que sinto diante dos desafios que passo, eu entendi a diferença entre fé e esperança.

Fé é você acreditar, ter certeza de que algo vai acontecer, de que sempre vai acontecer o melhor. Esperança é você torcer para que algo aconteça, é torcer para o melhor.

Há uma passagem no evangelho de Jesus onde os apóstolos pedem a Jesus para curar um doente. Jesus fala para os apóstolos que eles são homens de pouca fé, que se tivessem a fé do tamanho de um grão de mostarda seriam capazes de realizar a cura. O que aprendi com isso? Aprendi que é necessário só um pouco de fé para operar milagres em nossas vida. Mas que esse pouco de fé é muito difícil de ser alcançada por nós, humanos. pelo menos, para mim é.

Por que é tão difícil ter fé?

O que você acha?

Me ajude com sua resposta!

Obrigada.
Beijo.
Dani.

domingo, 4 de outubro de 2015

Dia da beleza

Passei por aqui rapidinho para dizer que semana passada tive um dia de beleza que me fez muito bem. Fiz depilação completa, até sobrancelha, arrumei unhas e cabelo. Adorei. O melhor é que nada foi programado.

Lição do momento:
não estou morta, apesar da  morte andar por perto . Eu mereço e devo fazer isso sempre. Tenho que me lembrar todo dia que sou uma mulher apesar da ELA. é difícil, mas tenho que me esforçar para isso. #ficaadica

Obrigada. Beijo.
Dani.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Escolhas

A vida é feita de escolhas e é essa capacidade de escolher que me mantém viva. Sempre peço que não me tirem isso para que eu não me transforme em uma morta-viva. Por mais difícil que seja a escolha, essa capacidade coloca nosso cérebro para funcionar e isso é bom demais.

Esse assunto é recorrente aqui no blog porque é muito difícil para as pessoas entenderem  e aceitarem que eu penso e sinto e que o meu corpo que, parece vazio aos olhos de quem vê, está cheio de pensamentos, sentimentos, ideias, inseguranças, medos, etc.

Na minha última internação aconteceu algo interessante. O médico de plantão que estava me assistindo, vinha todos os dias de manhã conversar com o meu pai fora do quarto. Em seguida, entrava no quarto com muita gentileza, me dava bom dia e me examinava. Um dia, ele entrou no meu quarto e disse que tinha lido meu blog. Disse, ainda, que estava impressionado com o que tinha lido e que aquelas palavras serviam tanto para os doentes quanto para os profissionais de saúde. A partir daí o comportamento dele, em relação a mim, mudou. Ele começou a conversar comigo quando vinha me examinar e tudo que ele falava com meu pai fora do quarto, ele me contava quando entrava. Fiquei feliz e orgulhosa porque pude tocar um coração. Por meio das minhas palavras, ele viu que havia um ser humano dentro daquele corpo que parecia sem vida.

Bom, eu tenho capacidade cognitiva para escolher o que acho que é melhor para mim. Usei a palavra "acho" porque nunca temos 100% de certeza das escolhas que fazemos. Sempre fica uma dúvida sobre se a outra opção seria melhor. Enfim, não há como saber. Temos as escolhas que serão certas e aquelas erradas. Só o tempo dirá... e não adianta se arrepender ou se lamentar das escolhas do passado. Elas foram  feitas baseadas no conhecimento que tínhamos na época. Se fossem feitas com o conhecimento que temos hoje, provavelmente os resultados seriam diferentes.

Eu gostaria de contar de uma escolha que fiz. Em maio de 2014, tive uma aqueda brusca de saturação e eu que já usava bipap, tive que passar para o  ventilador mecânico (trilogy). Para minimizar minha falta de ar, o médico da ambulância, em conjunto com minha pneumologista, me passaram predinisona. Digo que é a pílula dos sohnhos, pois melhorou minha respiração e diminuiu minha secreção, gerando um bem estar geral. Fiquei muito tempo tomando predinisona por orientação da pneumologista. Eu pegava a receita com o médico do home care, que vinha toda semana. Às vezes, ele queria retirar a medicação e eu, só pensando no bem estar que ela me causava, pedia para continuar seu uso e o médico deixava. Meses depois, eu descobri que predinisona era corticoide. E outros meses depois, quase um ano após o início do seu uso, eu descobri que a pílula dos sonhos era, na verdade, um pesadelo, pois o corticoide traz mais malefícios que benefícios a nossa saúde.

Eu não sabia disso. Só depois de muito tempo, quando meu pai começou a acompanhar as medicações que eu tomava, que os médicos foram me falar dos efeitos negativos e prejudiciais do corticoide. Por ignorância e falta de orientação, eu me envenenei por quase um ano. Resultado disso no meu corpo: baixa de imunidade e seis infecções seguidas, afinamento das veias e dificuldade de pegar acesso venoso para dar medicação ou fazer exame de sangue e, por último e mais chocante: catarata.

Isso mesmo, aos 39 anos, estou com catarata, pelo uso excessivo de corticoide. Na hora, meu chão caiu, afinal, meus olhos são meu único contato com o mundo e agora, meu mundo estava embaçado. Revoltei-me com Deus, já que quanto mais saúde eu pedia em minhas orações, mais doença Ele me dava. Depois que eu me acalmei, eu entendi que Deus não tinha nada a ver com isso. Minha catarata foi única e exclusivamente resultado de uma escolha infeliz do passado. Usei o meu livre arbítrio e fiz uma escolha errada, cujas consequencias foram terríveis. Apesar de tudo, não me arrependo de nada. Se escolhi errado, fazer o quê? Tentar arrumar as coisas. Mas isso faz parte da vida e quero continuar viva, fazendo minhas escolhas, sejam certas ou erradas.

Mas fica a dica: não tomem corticoide por um longo período de tempo. É melhor até evitar!

Força, fé e coragem!

Obrigada.
Beijo.
Dani.




terça-feira, 4 de agosto de 2015

Caridade X ELA

 O que é caridade? Desde que eu fiquei doente, eu aprendi que a maior caridade que poderíamos fazer pelo nosso próximo seria doar o nosso tempo. Para mim, que graças a Deus, tenho tudo que preciso (de recurso material), continuo achando que minha felicidade se encontra quando alguém arruma um tempo e vem me visitar. Para vocês entenderem como sou privilegiada, eu tenho visitas fixas semanais. Toda segunda feira, dois casais vêm fazer o evangelho conosco. Toda quinta feira, vem um casal me dar passe e orar por mim.

Mas infelizmente, há pessoas que precisam mais do que orações. Há pessoas saudáveis que não têm o mínimo necessário para viver. Imagine pessoas doentes? Eu sempre falo que a saúde não tem preço, mas a doença tem e é cara.

Gostaria de falar sobre a ELA - Esclerose Lateral Amiotrófica, cuja doença sou portadora. Ela é uma doença que afeta o primeiro e o segundo neurônios motores , causando atrofia da musculatura e, consequentemente, perda de todos os movimentos do corpo. É uma doença devastadora e que exige vários recursos materiais, para que o paciente tenha mais qualidade de vida e, até mesmo recursos vitais.

Dizem  que a expectativa de vida de vida de um portador de ELA é em média de dois anos. Mas o que eu percebo é que essa expectativa de vida é mais comum em pessoas que não possuem acesso a informações, bons médicos e nem os recursos financeiros necessários para adquirir os equipamentos para se manterem vivos. Os portadores de ELA que têm condição financeira, informações e acesso a bons médicos e bons equipamentos, vivem 10, 20, 30 e até 50 anos, como o físico Stephen Hawking. Você pode conhecer mais sobre ele e sobre a ELA no filme "A teoria de tudo". Recomendo.

E é aí que entra a Associação Pó-Cura da ELA. Ela ajuda aqueles pacientes que não têm condições financeiras, fornecendo informações, orientações e diversos equipamentos como ambus e bipaps e trilogys (respiradores mecânicos). Além disso tudo, eles desenvolvem treinamentos para profissionais da saúde e cuidadores de paciente.

"Com a mensagem “Todo agosto, até uma cura”, os fundadores da Campanha, Pete Frates e Pat Quinn, compartilharam um vídeo desafiando as pessoas em todo o mundo a continuarem com o desafio também em 2015. 

Para assistir ao vídeo, clique no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=ac5OURtF2wY
Para a Associação Pró Cura da ELA, a Campanha do Balde de Gelo de 2014 foi simplesmente transformadora." Jorge Abdala, Presidente da Associação.

Em função de do exposto, a Associação, os pacientes e seus familiares se juntaram apoiando, incentivando e divulgando a campanha do balde de gelo, durante o mês de agosto, até ser encontrada a cura dessa doença terrível. Para isso, contamos com a sua ajuda para divulgar e contribuir com a nossa causa. #juntossomosmaisfortes

Tenho um pedido especial a fazer. Dia 23/08, é meu aniversário. Já faz alguns anos que peço as pessoas que querem me dar presentes, que me deem outras coisas para doações, como fraldas geriátricas, leite em pó, cestas básicas, etc. Uma instituição é escolhida e tudo é doado.

Este ano, gostaria de pedir a todos aqueles que quiserem me presentear, que fizessem uma doação para a campanha do balde do gelo. Não importa o valor. Não quero comprovantes bancários. Doe quanto puder. Ficarei agradecida com qualquer valor. O importante é o ato. Meu único pedido é que você me passe seu nome inbox, pelo facebook para sabermos quantas pessoas se envolveram. https://www.facebook.com/danielle.nepomuceno

Como doar? basta fazer um depósito na conta:
Banco Bradesco (237)
Agência: 2962-9
Conta corrente: 2988-2
Razão Social: Associação Pró-Cura da Esclerose Lateral Amiotrófica
CNPJ: 18.989.225/0001-8
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Tem uma foto anexa explicando tudo direitinho.

Mas, afinal, o que é caridade? Para mim, se resume na máxima de Jesus, em "Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo." Vamos fazer o bem ao próximo que tanto precisa de nós.

Fé, força e coragem.

Obrigada.
Dani.





quinta-feira, 30 de julho de 2015

Ser eu X ser doente

Eu lutei lutei, lutei, luto, luto, luto para ser eu apesar da doença. Mas é difícil. Até profissionais que se dizem experientes, que dizem que já tiveram tudo que é tipo de paciente têm dificuldade de me ver como um ser humano e de me respeitar como tal.

No filme "Para sempre, Alice", da professora com alzheimer (Julianne Moore), o que mais me chamou atenção, foi o esforço dela de se manter ela e de se manter sã, apesar do progresso da doença. Ela se esforça tanto que programa seu suicídio para quando estivesse fora de si. O suicídio não aconteceu, mas achei a cena chocante. Lá pelo final do filme, quando já está tomada pela doença, ela e o marido vão a uma sorveteria de sempre. Ele pergunta a ela: "Você ainda gostaria de estar aqui?" Ela responde: "Claro, ainda não terminei o meu sorvete." Nem preciso dizer que nesse momento eu fui as lágrimas. Na verdade, o marido queria saber se ela ainda queria estar viva e entre eles apesar da doença. E ela, que já tinha sido tão intelectualizada, não compreendeu a pergunta.

E você, ainda, gostaria de estar aqui? Quem faz essa pergunta, agora, sou eu.

Essa pergunta ficou martelando na minha cabeça por semanas. Sim, eu ainda gostaria de estar aqui, mas só enquanto eu for eu e não desistir de lutar por isso. Eu ainda gostaria de estar aqui, mas só enquanto eu tiver qualidade de vida, mesmo que isso represente menos tempo de vida. Apesar de extenuante, eu ainda acredito em mim e no meu potencial. Por isso, ainda, me mantenho firme no meu propósito. Se fosse pelo outro, eu já teria desistido há tempos. Poucas são as pessoas e, principalmente, os profissionais de saúde que me surpreendem quando se trata de respeitar um próximo, como eu, que só mexe o olhos mas permanece com o cognitivo intacto.

Sabe por que isso acontece? Porque a grande maioria das pessoas querem impor sua vontade sobre os demais, se aproveitando da fragilidade dos doentes. É o tal do poder. E aí, um paciente consciente atrapalha esse exercício do poder, pois ele pode pedir socorro. Bom, felizmente ou infelizmente, eu não sou a Alice do filme. O dia que eu me perder de mim mesma, eu vou saber disso e, aí, já era porque nada fará sentido para mim.

Recentemente, eu quase me perdi. Agradeço a Deus por isso, pois apesar de ter sido um momento difícil, quase irrecuperável, foi ele que me salvou. A minha maior queda foi minha salvação porque me deu coragem de dar um basta.

Em um momento em que eu estava fazendo o cough assist, uma pessoa falou para mim: "se conforma, Danielle, você não controla mais nada". O pior não foi o que ouvi, foi o olhar da pessoa que me falou isso. Nunca vou esquecê-lo. Um olhar frio e desacreditado. Foi quando eu entendi tudo. Fiquei catatônica por uns 20 minutos talvez. Quando fui voltando a mim, as lágrimas foram escorrendo lentamente e eu fui me lembrando da Alexandra Szafir, do Dr. Vanderlei Lima, do Jorge Mello, do José Leda e de outros portadores de ELA, que possuem tantos projetos de vida e a mesma doença que a minha. Foi quando eu pensei por que eles podem e eu não? O que eles têm que eu não tenho? As respostas a essas duas perguntas me salvaram.

Quem sabe um dia eu possa contar as respostas. Por enquanto, não é possível. Mas posso compartilhar meu aprendizado com tudo isso. As adversidades podem ser boas, até determinado limite, para não se tornar abuso. Temos que aprender a entendê-las e aceitar ou acreditar que não merecemos isso. E então, ter coragem de mudar. Se eu, que sou vista como moribunda por muita gente, consegui, você também consegue.

Força, fé e coragem!

Obrigada.
Dani.


sábado, 18 de julho de 2015

Dicas de vida

Depois do meu post sobre coragem, recebi algumas mensagens de pessoas dizendo que seus familiares portadores de ELA não possuíam a força e a coragem descritas no meu texto. Como escrevi, os momentos de desânimo e depressão aparecem, mas luto, diariamente, para vencê-los.

Mas, realmente, não é fácil. A ELA é uma doença devastadora. Acordar, todo dia, e ter que lidar com os sintomas da doença é difícil. Por isso não exija do seu familiar uma coragem que ele ainda não possui. Enfatizo o ainda porque acredito que pequenas mudanças na rotina do portador da ELA, podem fazer essa coragem surgir naturalmente.

Pretendo com este texto, fornecer sugestões de comportamentos que visam melhorar a qualidade de vida dos portadores de ELA e, quem sabe, fazê-los ter mais vontade de viver.

Essas sugestões são baseadas, únicas e exclusivamente, nas minhas experiências (boas e ruins) e irei chamá-las de "dicas de vida."

  • Comunicação. A impossibilidade de se comunicar, de não poder dizer o que sente, parece-me um dos maiores motivos de tristeza. Para isso existem alguns tipos de comunicação alternativas. O profissional que pode te ajudar com isso é o terapeuta ocupacional. Mas se você não tiver acesso a um, procure o pessoal da Associação Pró-Cura da ELA. Acredito que ele pode te ajudar.
    • A comunicação alternativa, normalmente são tabelas com letras e números. O portador da ELA se comunica por meio do piscar de olhos. Duas dicas: tenha um caderno para anotar as letras a medida que seu familiar for piscando os olhos até você decorar tudo e ter agilidade e mantenha uma cópia da tabela colada em uma parede do quarto, onde todos possam vê-la. Use-a sempre, tenha paciência e converse com o seu familiar. Dê oportunidade dele dizer o que sente e o que deseja.
    • Há, também , outra forma de comunicação alternativa usando a tecnologia. É um sensor ótico que lê e movimenta  as opções do computador por meio da íris do olho. Neste caso, para usar a ferramenta, o portador da ELA tem que ter intimidade com computador, ou seja, tem que conhecer e ter experiência com informática. Conhecimentos básicos não são suficientes. Outro ponto de atenção, o custo desse sensor é elevado. Daí, o acesso é difícil. É por meio desse sensor que escrevo no blog. Para obter mais informação, sugiro que vocês também procurem a Associação Pró-Cura da ELA.
  • Participe seu familiar de todos os eventos da família. Não o deixe trancado no quarto enquanto está acontecendo a maior festa no quintal. Por mais difícil que possa ser, leve-o para festa. Se ele tiver uma cadeira de rodas, melhor. Se não tiver, leve a cama, uma poltrona, sei lá... use a sua criatividade. Faça-o se sentir pertencente à família. Outra dica legal, é fazer a festa dentro do quarto do familiar. Como assim? Por exemplo, é aniversário do filho do familiar doente, compra-se um bolo e toda família reunida canta parabéns. Ah, o quarto é pequeno? Sem problema, todo mundo se aperta por alguns minutos. Garanto que ver a alegria do seu familiar, vai valer a pena qualquer aperto. 
  •  Pela manhã, dê banho no seu familiar, tire o pijama e coloque uma roupa escolhida por ele. Nunca deixe seu familiar o dia inteiro de pijama. Lembre-se de que ele está vivo. Mantenha o cabelo arrumado e cortado conforme o gosto dele. Coloque perfume. Se ele usar fraldas, troque-as sempre que necessário. Se ele salivar muito, use os remédios indicados pelo médico, coloque uma toalha no pescoço e limpe a boca dele sempre que necessário. Não o deixe babando. É muito desagradável.
  • Leve seu familiar par passear. Não o deixe o dia inteiro na cama. Faz bem para o corpo e para a mente sair da cama e do quarto, ir para a sala ou quintal, ver o sol, ver as árvores e ver outras pessoas. Providencie uma cadeira de rodas. Se não puder comprar uma, tente pelo SUS. O pessoal da Associação Pró-Cura da ELA pode te orientar.
  • Quando o seu familiar estiver fora do quarto, não o exclua dos momentos familiares, não o deixe marginalizado em um canto da sala. Converse com ele, coloque-o no meio das pessoas, mesmo que atrapalhe a passagem. O outros são saudáveis e darão um jeitinho de passar. Se houver um almoço em família, coloque um lugar a mesa para ele se sentar, mesmo que ele use gtt e não vá comer. Durante o almoço, converse com ele. Se ele já tiver perdido a fala, use a comunicação alternativa.
  • Coloque músicas que seu familiar goste de ouvir. Mas nada de música triste.
  • Crie em sua casa um ambiente de paz e amor. Coloque o seu familiar como prioridade. Dê amor, carinho, apoio e incentive as coisas que ele quer fazer.
  • Respeite a vontade dele. Afinal, a mente dele é intacta. Ele é capaz de tomar algumas decisões por si. Permita que ele faça isso.
  • Dedique, diariamente, uma parte do seu tempo ao seu familiar. Pode ser algo simples como ver a novela, um filme ou ler um livro.
  • Eu sei a trabalheira que é cuidar de um portador de ELA. Mas se há amor e paciência, o fardo se torna mais leve. Aliás, nunca fale que ele é um fardo ou que ele atrapalha a sua vida. Não o faça se sentir culpado. Nada é por acaso, se seu familiar está doente e se você precisa cuidar dele, é porque Deus permitiu e tem um propósito de aprendizado para vocês.
  • Nunca fale que seu familiar é um fardo, mas se ele se tornar um, procure um outro familiar para cuidar dele. É melhor assim. Faça isso enquanto tem paciência. Não espere chegar ao seu limite.
  • Mantenha a mente do seu familiar funcionando. Desenvolva, em conjunto, um objetivo de vida para ele, mesmo que ele precise de ajuda para executá-lo. Leve em consideração o que ele gosta, qual é a sua profissão. Não precisa ser algo grandioso. Pode ser algo simples como ler dois livros em um mês, programar a ceia de natal, fazer um curso na igreja, o cardápio da semana, organizar fotos antigas, enfim... use a sua criatividade. Para se sentir vivo, a gente tem que ter objetivos e metas. A medida que os objetivos e metas forem cumpridos, vocês devem criar outros. É um círculo virtuoso.


Todos temos que ter em mente que receber um diagnóstico de ELA, é como receber uma sentença de morte. Mas não a morte como um fim e, sim, como uma transformação. A medida que nosso corpo vai se enfraquecendo e se atrofiando, nossa mente vai se fortalecendo e se desenvolvendo. Lembre-se de que o espelho não reflete a imagem de quem somos. Não se limite a isso. Somos muito mais. Nossa mente não tem limite. Vamos usá-la.

 O desenvolvimento do nosso corpo e da nossa mente deve ser inversamente proporcional. Tem que ser assim. Só assim teremos condição de aceitar as fases da doença. Entender que os momentos difíceis "fazem parte" diminui o sofrimento e aumenta a coragem, até porque um dia eles vão passar. Acredite em seu potencial. Acredite em você.

Força, fé e coragem.

Obrigada.
Beijo.
Dani.




quarta-feira, 8 de julho de 2015

Coragem

Na vida, todos temos que ter coragem, mas portadores de algumas doenças, como a ELA, precisam ter mais coragem que as pessoas saudáveis. Passamos por situações inimagináveis. E sempre observo que os portadores de ELA são fortes e corajosos. É quando eu penso que nada é por acaso. Há um motivo para eu estar nessa situação.

Aqui no blog, eu vou compartilhar com vocês, os meus momentos de coragem.

  • Coragem para aguentar, aguentar e aguentar.
  • Coragem para tentar superar, para conseguir superar e para não conseguir superar.
  • Coragem para acordar de manhã sabendo que minha rotina é pesada.
  • Coragem para ir dormir apesar do medo de morrer de falta de ar.
  • Coragem para tomar banho sabendo que ele vai durar umas duas horas, que eu vou sentir dor e incomodo durante o deslocamento no guincho e que precisarei ser aspirada umas 4 vezes por causa do excesso de movimento do corpo.
  • Coragem para tomar banho e ver que todo o esforço e sacrifício valeram a pena porque eu me sinto limpinha.
  • Coragem para tomar banho de  sol, no quintal aqui de casa, depois do banho, apesar de sentir muita dor nas costas e no quadril pelo excesso de tempo na mesma posição.
  • Coragem para chegar ao limite e, ainda, aguentar mais.
  • Coragem para agradecer a Deus por eu ter um guincho e poder tomar banho no banheiro.
  • Coragem para seguir em frente quando eu quero  recuar.
  • Coragem para recuar, quando todos querem que eu siga em frente,
  • Coragem para aceitar que pulsionem a veia da minha cabeça, depois de meia hora chorando de medo, para ouvir do médico que sugeriu o procedimento, que nem ele e nem o técnico de enfermagem que estavam aqui, sabiam fazer o procedimento e não iriam arriscar.
  • Coragem para levar umas 100 furadas pelo corpo, em 40 dias, até achar um acesso venoso.
  • Coragem para dizer não e não ser respeitada.
  • Coragem para dizer a verdade em qualquer circunstância.
  • Coragem de enfrentar a solidão se isso representa meu bem estar.
  • Coragem para enfrentar quatro infecções recorrentes.
  • Coragem para fazer várias nebulizações, manobras pulmonares, aspirações, ambus e cough assist para tentar manter meu pulmão limpo.
  • Coragem para valorizar os pequenos momentos de felicidade.
  • Coragem para enfrentar os momentos de tristeza, chorando até me acabar.
  • Coragem para enfrentar o preconceito se isso representa o meu bem estar.
  • Coragem para aceitar que sozinha não sou nada e que para ultrapassar meus limites, eu preciso estar cercada de pessoas que me incentivem e me apoiem.
  • Coragem para aceitar que não sou mais independente e que dependo 100% do outro e que esse outro pode não ser muito legal comigo.

 E o mais importante:
Coragem para recomeçar quando muitos acham que é o meu fim.

E quando a coragem falta, o que sempre acontece, afinal sou humana, eu penso primeiro em Deus, depois na minha família e nas demais pessoas que me amam e que desejam meu bem estar. Isso me dá uma força e uma coragem impressionantes, algo fora de série, que me transforma em uma leoa defendendo suas crias. Passa o tempo e o desânimo vem de novo, aí eu penso primeiro em Deus e o ciclo vai se repetindo... momentos de coragem e desânimo, mas sempre lutando pelos momentos de coragem.


sexta-feira, 22 de maio de 2015

A Traqueostomia

Fui internada dia 23/04 para tratamento de uma infecção pulmonar. Meus exames de sangue estavam ruins e meus médicos acharam melhor o tratamento endovenoso. Não tinha data para a traqueostomia, nem para a troca da gtt. Até porque estava difícil conciliar as agendas dos dois cirurgiões torácicos e do gastro.  Foi aí que desistimos de trocar a gtt e priorizamos a traqueostomia. A cirurgia foi marcada para o dia 26/04, um domingo, as 8h30. Mas um dos cirurgiões, amigo do gastro, ia ver se ele poderia ir  na data marcada. Mas a princípio seria só a traqueostomia.

Dia 26/04, cedo, eu estava pronta. Para eu me sentir mais segura, minha técnica e meu fisioterapeuta participariam da minha cirurgia. Quando cheguei ao centro cirúrgico, os dois foram trocar de roupa e eu entrei sem eles. Vi um corredor longo, cheio de macas e algumas pessoas nelas. Uma visão horrível. Achei o centro cirúrgico feio e velho. Parecia sujo e eu acho que precisa de reforma. Bem, me levaram para a sala e eu gemendo, desesperada porque queria minha técnica perto de mim e ela ainda estava trocando de roupa. Apesar do desespero, tive um momento de felicidade. Vi os olhinhos puxados do meu gastro por debaixo da máscara que ele usava. Isso significava que eu iria trocar a gtt. Bom que eu não precisaria ser sedada novamente. Faria tudo junto. O anestesista chegou e foi me colocando na mesa cirúrgica, me deixando toda troncha. Mas o pior momento foi quando ele disse para tirar a máscara. Entrei em pânico, com medo de sufocar. Comecei a gritar "não" e senti um liquido entrando na minha veia. Apaguei. Foram minhas últimas lembranças. Anestesia geral é tudo de bom.

Quando voltei, eu vi o rosto da minha técnica. Fiquei aliviada. Achei que eu fosse me sentir mais confortável sem a máscara, mas confesso que não fez a menor diferença. Nem percebi que estava sem. Só queria pedir a minha técnica para levantar a cabeceira da cama, mas meus olhos estavam pesados e eu não consegui dizer nada. Depois de alguns minutos, eu consegui me comunicar e fui para o quarto. Não precisei de UTI. Na volta ao quarto, eu só me lembro da minha mãe me dando um beijo e dizendo que estava feliz por me ver. Não me lembro de muitas coisas desse dia. Não sei se tomei banho ou fiz outras coisas. Sei que meus pais, meu irmão e meu marido estavam lá, mas não me lembro o que eles falaram ou o que conversamos.

O que aconteceu nos dias subsequentes a cirurgia foi que eu tive cada vez mais dificuldade para respirar. Às vezes minha saturação caia, outras não, mas o esforço para respirar era enorme e eu ficava cada vez mais exausta. Toda noite era preciso chamar o fisio da UTI para me atender. Fui melhorando à medida que os parâmetros do respirador foram ajustados. Teve um dia que eu estava tão mal que meu pai, em um momento de desespero, disse para eu reverter a traqueostomia. Me partiu o coração vê-lo assim. Até porque, por mais que quiséssemos, essa opção era inviável. Depois que voltei para casa, uma das minha técnicas me confessou que achou que eu ia morrer. Engraçado que em nenhum momento eu pensei nisso. Não por mérito meu, mas porque, simplesmente, não tinha chegado a minha hora. Eu acho que nós sabemos ou sentimos quando a morte está por perto

Além disso, uns 10 dias depois da cirurgia, eu tive um grande sangramento. Por volta das 2h da manhã, eu senti um liquido escorrendo pelo pescoço, mas como eu estava babando muito, eu achei que fosse saliva. As 6h, minha técnica viu o sangramento. Nesse momento, fiquei com medo porque ela fez uma cara de assustada e disse que ia chamar o fisio da UTI. Primeiro vieram duas enfermeiras. Elas foram péssimas. Disseram que não iam chamar o fisio porque eu estava sangrando em função da posição da minha cabeça que estava para frente e começaram a me pagar sapo. Fiquei indignada, pois independente do motivo, elas tinham que chamar alguém para me examinar. Depois de muita insistência, elas chamaram o fisio. Ele examinou e disse que o sangramento era externo (menos mal) e que ia chamar o médico. Vieram dois, um me examinou e disse a mesma coisa que o fisio e que ia chamar um cirurgião. A médica cirurgiã veio e disse que o sangramento não era decorrente da posição da cabeça e que eu podia ficar na posição que eu quisesse e que, inclusive, eu poderia fazer ambu quantas vezes fossem necessárias porque o meu conforto e a minha respiração eram prioridades. Ainda disse que era obrigação dela estancar o sangue. Ela fez um curativo e disse que voltava depois. Não sei porque, mas adorei essa médica! kkkkkk... Bom, depois de muitas visitas médicas, chegamos à conclusão de que o problema era o clexane, um anticoagulante que eu estava tomando em dose máxima e estava dificultando minha cicatrização. Suspenderam o clexane e o sangramento foi reduzindo.

Depois disso tudo, veio a parte mais difícil: adaptação. Está muito difícil. Eu "achava" várias coisas que não aconteceram. Eu achava que minha respiração fosse melhorar, que a secreção e quantidade de aspirações fossem reduzir, que eu fosse ter mais conforto, que eu não fosse sentir dor e incômodo quando mexessem em mim, que salivação fosse reduzir, que o cuff não fosse incomodar tanto, enfim... muitas coisas... juntando tudo que aconteceu: dificuldade para respirar, para me adaptar e para cicatrizar, eu fiquei muito triste. Fui desenvolvendo um sentimento de autopiedade que acabou com o meu emocional.

Temos que ser submetidos a alguns procedimentos para não pegarmos uma infecção, para manter o pulmão limpo e para respirarmos melhor. São eles: 

1. Cough assist. É uma máquina que tosse por mim uma vez que eu não tenho força para tossir e eliminar a secreção pulmonar. A máquina é conectada a traqueia. Em seguida, ela faz uma pressão positiva, jogando ar para o meu pulmão por dois segundos. Na sequência, a máquina faz uma pressão negativa e puxa o ar por mais dois segundos. Quando o ar é puxado, a secreção vem junto. Para finalizar, dois segundos de pausa. Fazemos seis ciclos desse por vez, a quantidade de vezes que for necessária. Para o nosso bem estar, precisamos ser submetidos ao cough assist várias vezes por dia.

2. Desinsuflar cuff: "cuff é um manguito localizado ao redor da traqueostomia ou tubo orotraqueal. Quando o balonete é preenchido com ar, ele se encaixa (molda) a forma da traquéia. Este balonete veda o espaço entre a parede da traquéia e a prótese ventilatória. cuff é insuflado pela entrada de ar através da linha de insuflação/desinsuflação e o balão-piloto."** 
Não sei o motivo, mas a saliva da boca vai se acumulando no cuff, causando muito desconforto. Quando desinsuflam o cough, essa saliva que virou secreção bem espessa, sai pela garganta. Sai muita coisa. é nojento. Como a secreção é empurrada pelo ar, quando ela sai, eu começo a tossir, como se fosse vomitar. Horrível.

3. Aspiração: como eu não consigo cuspir, engolir, pigarrear, escarrar ou assoar nariz, toda secreção da traqueia, garganta, boca e nariz precisam ser retiradas pela aspiração. Enfia-se uma sonda, ligada a um aspirador, par sugar a secreção. A secreção do nariz e da garganta aumentou depois da traqueostomia para aumento do meu sofrimento.

4.Uso do ambu: é usado para aumentar nossa expansão pulmonar e, consequentemente, nossa ventilação. Ele também é utilizado para mobilizar a secreção.

Sou submetida a esses procedimentos várias vezes por dia é horrível porque é muito desconfortável. A cada vez que sou submetida a eles, eu morro um pouquinho porque é sofrido. Mas quando acaba, o alívio é grande e, como a Fênix, renasço das cinzas.  Esse processo de morte e renascimento é muito desgastante. Fico exausta, inconformada, triste, com raiva e choro com pena de mim mesma, mas faz parte da minha vida e eu terei que superar mais esse momento.

Usar traqueostomia é horrível. Achei que minha respiração fosse ficar limpa, mas não. Posso fazer todos os procedimentos indicados, como desinsuflar e insulflar cuff, cough e aspirar, que 5 minutos depois, a traqueia volta a roncar por causa da secreção. Estou tendo que aspirar as 6h da manhã. Quando eu usava a máscara, eu aspirava antes de dormir e depois só as 10h da manhã do dia seguinte. Não subia secreção e eu não salivava durante a noite. O filtro da traqueo é umidificado, fica encharcado o tempo todo e precisa ser sacudido para retirar o excesso de água. O cuff tem um valor máximo de pressão para não necrosar a traqueia. Temos que ficar de olho nisso. Achei que não fosse precisar aspirar o fundo da garganta. Mas precisa porque toda vez que desinsufla o cuff, sai secreção e, as vezes, a secreção vaza para garganta. Já aconteceu do cuff desinsuflar sozinho e eu acordar assustada, durante a noite, com aquela secreção minando da minha garganta e com uma sensação de engasgo e ânsia de vômito.

Mas há duas coisas piores. Uma delas foi que eu não consigo mais gemer. Antes, eu conseguia gemer e chamar as pessoas. Por exemplo, durante a noite, quando eu estava com dor ou desconfortável, eu gemia, a pessoa que estava no quarto comigo, acordava, e vinha ver o que queria. Agora, eu preciso esperar alguém acordar, para me olhar e vir ver qual é minha necessidade. Um dia, fiquei quase uma hora com uma dor gigante na perna esquerda até alguém vir me socorrer. Resumindo: estou exausta porque não durmo nada. Outra coisa, é que achei a conexão do circuito (mangueira) do respirador com minha traqueia muito frágil. Se não ficar bem presa, a própria pressão do ar expulsa a mangueira da traqueia. Isso já aconteceu comigo algumas vezes e, por isso, não posso fica sozinha. Se houver demora para colocar a mangueira do respirador na minha traqueia, eu posso morrer com falta de ar. Isso me deixa tensa e está dificultando minhas noites de sono. Fora que eu dormia de lado, mas não tenho coragem de ficar nessa posição novamente.

Há algo que deixei por último e que foi tão difícil quanto as outras coisas. Me ver no espelho. Não foi fácil ver meu rosto atrofiado, deformado e inchado sem a máscara. Não me reconheço nessa imagem onde não dá para identificar se estou sorrindo e chorando. Eu não tenho mais expressão. Eu não era linda, mas tinha meus encantos. Meu olhar e meu sorriso eram marcantes. Pelo menos, eu gostava. Só que agora acabou. Só há uma forma de saber o que estou sentindo: me perguntando.

Ainda estou com muita dor na traqueostomia, principalmente na parte interna e na parte externa quando prendem e tiram a mangueira da minha traqueia. Talvez, seja necessário trocar o modelo da traqueo. Espero que seja isso... dos males, o menor.

Não sei o porquê, mas ando exausta. Meus olhos estão mais pesados. Está mais difícil para usar o computador. Minha saturação está ótima. Mas parece que tenho que me esforçar mais para respirar. Vamos torcer para que essa dor passe, as coisas se normalizem e eu possa ter um pouco de qualidade de vida.

Gostaria de me desculpar com os leitores que esperavam um texto cheio de otimismo. Estou muito triste. Eu esperava um procedimento sem intercorrências, mas não foi assim. Eu não escrevi tudo que aconteceu para não expor os profissionais envolvidos, mas tiveram cagadas que impactaram diretamente na minha recuperação. Enfim...  a minha esperança é que tudo passe, como passaram as outras etapas da doença, como a gtt, o começo do uso do respirador e a perda da fala. São esses momentos que me enchem de esperança porque eles foram superados, tanto que nem me lembro das dificuldades enfrentadas em cada um deles.

Gostaria de agradecer meus pais, irmão, marido, médicos, fisioterapeutas, meus fisioterapeutas, enfermeiros, técnicos de enfermagem, minhas técnicas e cuidadoras e a Amil por ter liberado minhas técnicas para irem ao hospital comigo. Se não fossem por vocês, eu não teria conseguido.

Obrigada você por ler meu blog

Beijo.
Dani.

** Fonte: http://www.concursoefisioterapia.com/2010/05/cuff-ou-manguito.html

domingo, 12 de abril de 2015

Qual é o limite do ser humano?

A ELA é uma doença que testa os nossos limites. Quando você acha que não dá mais conta, vem um novo desafio. E aí, você tem que escolher se desiste ou continua firme. Na maior parte das vezes, para seguir em frente, temos que abrir mão de algo, desapegar mesmo e isso não é fácil. Em todas as etapas da doença, eu ultrapassei meus limites, chegando muitas vezes à exaustão física eemocional. Mas como saber o momento de recuar para ganhar mais lá na frente? Certa vez escrevi no facebook: "persistência ou teimosia, como saber?"  Alguém respondeu: "se o resultado for positivo é persistência; se for negativo é teimosia." Realmente, nos julgamos e somos julgados pelo resultado de nossas ações. Mas algumas vezes, no caso da ELA, os resultados podem ser desastrosos e fatais.

A minha doença começou pelas mãos, fui parando de fazer as coisas aos poucos. Lembro-me da primeira vez que não consegui cortar um pedaço de pizza. Peguei a pizza com a mão e meu marido me chamou a atenção, envergonhado. Foi uma situação nova para nós dois. A partir dali, alguém precisava cortar a comida para mim. Comi sozinha até onde pude. Eu apoiava o braço na mesa, fazendo-o de alavanca. Para chegar a comida, eu abaixava a cabeça. Fazia o mesmo para escovar os dentes. Como não tinha o movimento dos braços, eu balançava a cabeça para cima e para baixo. E para fazer xixi? Eu prendia o polegar na lateral da calcinha e ficava rebolando para ela descer e pulava para ela subir. Era tanto esforço para fazer tudo isso que eu ficava exausta. Inclusive, só parei de trabalhar, quando não consegui mais fazer xixi sozinha.

Com os membros inferiores, foi a mesma coisa. Ultrapassei meu limite. Levei tantos tombos que perdi a conta e não sei como não perdi os dentes. Quando uma pessoa saudável cai, ela apoia as mãos para se proteger. Mas eu não tinha o movimento dos braços para me proteger. Parecia um saco de batata caindo. Depois de 20 pontos na cabeça, muitos galos e muito rosto ralado, eu comecei a andar de braço dado com as pessoas. Dessa forma, eu tropeçava, batia os joelhos no chão, mas a pessoa segurava meu braço, impedindo que minha cabeça caísse. A partir daí, não sei como ainda tenho joelhos. Caí tantas vezes, que eles viviam em carne viva, não dava tempo de cicatrizar. Ainda tinha um agravante que quando eu estava com a minha mãe, ela não tinha força para me levantar quando eu caia e eu dependia da boa vontade alheia e isso nem sempre acontecia. Claro que eu ficava arrasada a cada tombo, mas sabe a música que diz: "levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima"? Eu fazia isso.

Depois, veio a cadeira de rodas. Antes de comprar uma, eu aluguei para me acostumar com a ideia. Acho que foi uma boa decisão. Assim que fui para cadeira, fomos ao aniversário de um amigo do meu marido. Fazia meses que não víamos esse pessoal. Quando chegamos à festa, todo mundo ficou olhando para mim como se eu fosse um E.T.. Fiz uma cara do tipo nada está acontecendo e segurei as lágrimas que estavam na minha alma. Na verdade, as pessoas não estão preparadas para o que é considerado fora do padrão social normal. Com a cadeira de rodas, vieram as dificuldades de acessibilidade e de transferência da cadeira para o carro. É impressionante como as pessoas não respeitam as vagas de deficientes. Elas não são um luxo, são uma necessidade. Certa vez, eu e meu marido fomos ao prédio da Polícia Federal que fica no Setor de Autarquias Sul. Chegamos lá e havia dois carros na vaga de deficientes sem credencial. Estacionamos nosso carro atrás dos outros dois e deixamos minha cuidadora de olho. Ela disse que apareceu um casal de jovens que ficou sem graça e saiu de perto quando viu minha credencial. E os lugares? O único lugar realmente acessível é o shopping. O resto, pode saber, você terá dificuldade.

A minha transferência da cadeira para o carro foi outro desafio. As pessoas me levantavam pelas axilas, me abraçavam e eu caminhava até o banco do carro, onde eu era colocada de lado e virada depois. O problema era quando eu perdia a força das pernas porque vinha outro tombo. Cada saída era uma aventura. Mesmo depois de perder totalmente o movimento das pernas, eu ainda saí algumas vezes utilizando o guincho elétrico para fazer a transferência.

Mas aí a doença afetou a parte respiratória. Se você acha que já foi difícil o bastante chegar até aqui, você não sabe o que te aguarda. Este foi e é meu maior desafio. Comecei a sentir falta durante o dia até o momento em que tive uma queda brusca de saturação e precisei ser internada. Foi quando conheci o bipap, um aparelho que me ajudava a respirar por meio de uma pressão de ar no pulmão. Isso foi em agosto de 2013. Relutei em usá-lo, mas a dificuldade para respirar ficava cada vez maior. Ficou tão grande que chegou a afetar minha alimentação. Eu não conseguia comer. Ficava exausta. Mais uma vez, me esforcei. Relutei em fazer a gtt. E só aceitei colocar a sonda gástrica depois que emagreci 20kg. Confesso que, relembrando o que eu passei, eu devia ter feito a gtt antes. Mas eu tinha tanto medo de colocar uma sonda nasal que acabei postergando a gástrica, sem perceber que quanto mais eu postergava, maior era a chance de colocar a nasal de emergência. A minha sorte foi que nunca engasguei com comida. Mas engasguei com medicação. Daí, o comprimidos eram abertos e misturados à comida, alterando o gosto dela. Acho que isso acelerou o meu processo de emagrecimento.

E a respiração? Eu costumo dizer, quer saber como me sinto sem o respirador? Coloque um saco plástico na cabeça e amarre as mãos e os pés. Me sinto um pouco pior, mas a experiência está valendo para quem tiver interesse. Bom, sinto em informar que eu devia ter feito a traqueostomia, no mais tardar, em dezembro passado, quando minha secreção começou a aumentar. Lembra da história da persistência ou teimosia? Dessa vez, foi teimosia. Todos os dias, eu ultrapasso os limites do bom senso. Estou exausta e com medo. Não tenho mais força para aspirar o tanto de secreção que tenho. Às vezes, a falta de ar é tão grande que fico com as pernas e os braços dormentes e faço xixi na cama. Este é outro ponto, eu não uso fralda. Faço xixi na comadre. Não sei como vou me sentir depois da traqueostomia, mas acredito que pior não fique. Se eu puder dar a você, portador de ELA, um conselho, não enrole para fazer a traqueostomia. É necessário saber recuar para pegar impulso. Nunca desista, mas, sempre, mantenha o foco na sua qualidade de vida.

Quanto ao limite do ser humano. Bem, acho que não há limites. Felizmente, somos muito adaptáveis. Fora isso, podemos cansar pelo meio do caminho e, muitas vezes, desistir. Mas sempre haverá uma fagulha de vida dentro de nós que fará a gente persistir e até teimar, por que não? O mais importante é que essa fagulha nos mantém vivos e com esperança em dias melhores.

Essa última semana, eu tive uma infecção violenta. Fiquei muito mal. Gostaria de agradecer aos meus pais, meu fisioterapeuta, minha equipe de enfermagem e de cuidadoras por terem me ajudado a passar por esse momento. Foi um sufoco danado, mas a fagulha de vida que existe dentro de mim ainda falou mais alto.

Obrigada!
Beijo.
Dani.

domingo, 15 de março de 2015

Passeios e o tempo de Brasília

Passei a semana inteira querendo dar uma volta pelas ruas do meu condomínio, mas nunca dava certo. Primeiro por causa da minha rotina. De manhã é o horário do banho, que é demorado por causa da aspiração. Em seguida, tenho meus atendimentos: fisio, fono, terapia ocupacional e psicóloga. Aí vem mais aspiração. Ainda tenho a visita de amigos muito queridos toda semana, fora as visitas ocasionais. Muitas vezes, meu dia é tão cheio que não me sobra tempo para outras atividades.
Acho ótimo!

Normalmente, estou liberada lá pelo final da tarde. Só que choveu a semana inteira nesse horário e nada de passeio. Aí eu acordei ontem, vi um solzinho e pensei: de hoje não passa. Mas sabe o que aconteceu? Faltou luz e eu tive que tomar banho mais tarde. Enfim... Saí do banho as 16h embaixo de trovões. Só virei para Elisangela, minha técnica, e disse: RUA. kkkkkkkkk... eu sabia que ia chover e me colocar na cadeira demora um pouco. Fiquei pronta já eram 17h. Pedi um casaco e fomos para a rua, eu, Fábio, Francisco, Mairlene (cuidadora), Elisangela e meu pai.

Quando estávamos saindo nos encontramos com uma vizinha que ficou muito feliz por me ver na rua. Ela deu alguns passos conosco e foi embora. Continuamos andando distraídos com uma casa bem bonita na esquina. Andamos uns 200 metros até chegarmos ao final da rua. Quando de repente, só escuto um grito: olha a chuva! Quando eu olhei, estava tudo preto.  Aí foi o melhor momento do passeio. Em poucos segundos, a chuva nos pegou. Todo mundo começou a gritar e a rir.

A Elisangela tirou o jaleco e cobriu meu respirador. Foi então que começamos a correr. Com a cadeira em velocidade, eu sentia a brisa e as gotas de chuva no meu rosto. Uma sensação maravilhosa! De repente, senti uma toalha na minha cabeça e não via mais nada. Mas continuava ouvindo as risadas de todos e a voz do meu pai, em desespero, pedindo para que tivessem cuidado comigo. Nesse momento, Elisangela diz: Dani, olha a sua vizinha! Ela tira a toalha da minha cabeça e eu vejo a vizinha correndo em nossa direção com uma florzinha e um enorme guarda chuva na mão. Ri muito na hora. Ela coloca a flor no meu peito e alguém segura o guarda chuva. Muito gentil minha vizinha.

Chegamos em casa agitados e molhados. Meu irmão Fábio fala: se prepara para ouvir uma bronca da mamãe porque ela não queria que você tivesse saído. Bronca? Que nada! Ela estava secando o cabelo e nem percebeu que estava chovendo.

Fui dormir exausta, mas feliz. Fiquei passando as cenas na minha mente e rindo sozinha, agradecida a Deus por ter tido um momento tão simples, tão mágico e tão feliz.

Obrigada.
Beijo.
Dani.

domingo, 8 de março de 2015

Sem Comunicação

Fiquei sem  sem computador por quase 16 dias. Foi um Período bem difícil. Eu usava o computador há um ano e já estava acostumada a ele. Achei que fosse morrer de depressão. Mas como sempre diziam meu pai e o Alkinder, aquilo era uma máquina e podia pifar.Tive que me conformar.

Nos primeiros dias, o som dos meus pensamentos era ensurdecedor. Ele ecoava por cada célula do meu corpo.  Eu queria me expressar e não conseguia, mesmo com o uso do alfabeto. Ninguém me entendia direito e também não tinha muita paciência. Foi aí que descobri que só seria possível consertar o computador, enviando-o para a Suécia. Nesse momento, a conformação veio como desistência de ser compreendida e da vida. Tive medo da depressão. E aí, eu não falava mais. Ficava toda babada, com a toalha molhada, com a baba escorrendo pelas costas e não falava nada. As pessoas vinham aqui e eu só olhava. Teve um momento que o som dos meus pensamentos nem incomodava mais porque simplesmente eu não pensava. Então, meus pais chegaram com a notícia de que iam comprar o sensor de olhos da Tobii para mim. Meu coração se encheu de alegria e esperança. Mas tinha um problema: a semana seguinte seria carnaval. Tudo fechado e a empresa ficava em São Paulo. Tive que segurar a ansiedade. Meu irmão que mora lá comprou um notebook, foi na empresa, instalou os softwares, aprendeu a mexer, pegou um avião e veio para cá. Tudo isso depois do carnaval, claro.

Esse período entre o comunicado da compra e a chegada do computador foi mais tranquilo. Eu sabia que ia ter um fim. Como sempre digo, o que não mata, fortalece. Fui obrigada a aprender com o momento. Entreguei-me de corpo e alma para a minha equipe. Tive que confiar 100%. Passamos por momentos muito difíceis. Vou contar um deles aqui. Ninguém sabe ainda. Só sei que o saldo foi positivo. 

Em uma bela sexta-feira a noite, meu marido saiu para tomar chopp com os amigos. Nesse dia em especial, eu estava muito secretiva e com dificuldade para respirar. Meu xarope tinha acabado. Então, eu disse para a cuidadora ligar para meu marido, avisar que eu estava mal e precisava do xarope.  Sabe o que ela me respondeu? “Você acha que vai conseguir trazer seu marido de volta para casa inventando que está passando mal?” Entrei em choque na hora porque eu estava sozinha com a técnica e a cuidadora, sem computador, e elas achavam que eu estava mentindo. Comecei a chorar de soluçar. Fiquei pensando o porquê disso. Afinal, nunca havia mentido sobre o meu estado de saúde, nem me importado com as saídas do Alkinder, que nem são muitas. Enfim... no final das contas, eu fiquei pior por causa do choro, ninguém verificou meus sinais vitais e o Alkinder mandou a farmácia entregar o xarope. Foi uma experiência horrível.

Apesar desse incidente, o saldo foi positivo e meus dias foram melhores do que eu imaginava. Em função do meu jeito doce e sensível, para não dizer o contrário, todo mundo achou que seria mais difícil. Mas mal sabiam que a minha lista de reclamações estava gigante. Estava só acumulando as coisas na minha mente. Seriam dois dias só de reclamação quando o computador chegasse. Foi quando uma amiga veio me visitar e comentou que eu devia estar remoendo as coisas para explodir depois. Ouvir aquilo foi um tapa na cara porque eu estava justamente fazendo isso. Pensei que chata eu era e resolvi mudar. Afinal, toda a minha equipe estava se esforçando e me tratando muito bem e eu com o foco nas coisas pequenas e no negativo. Quando o computador chegou, não fiz nenhuma reclamação. Ao contrário, eu me dei conta que sem a ajuda e dedicação delas, eu não teria conseguido. Agradeci a elas do fundo do meu coração.

Enfim, sobrevivi aos 16 dias sem comunicação, mas marcas ficaram. A gente se acostuma a tudo, até ao silêncio. E eu desaprendi  a me expressar. Aprendi a não compartilhar. A gente se acostuma a não comentar o que achou da novela ou de uma propaganda legal. A gente se esquece de falar o que acontece com a gente. Triste? não acho. Isso é uma adaptação a realidade. Faz parte do meu processo.

Obrigada, principalmente, aos meus pais e ao Thiago por me devolverem a vida, ao Alkinder pelo suporte do computador, ao Fabio por ficar comigo e ter paciência de usar o alfabeto, aos meus amigos Carol, André, Aline, Lud, Jean, Priscila e Elton que vieram me visitar e me fizeram rir, mesmo sem computador e as minhas técnicas Elisangela e Rosana pela paciência, carinho e dedicação.

Obrigada a você por ler o meu texto.

Beijo.

Dan

quinta-feira, 5 de março de 2015

Qualidade de Vida X O Sistema

O que é qualidade de vida¿ Acho que todos concordamos que é uma coisa boa.  Eu percebo que muita gente associa o termo a algo além, como se qualidade de vida tivesse que ser extraordinária. Só que para mim, é algo simples como viver bem com o que se tem. Mas vai além disso.

Hoje eu me encontro em uma situação que fez com que eu mudasse muitos conceitos e valores.  Qualidade de vida foi um conceito que se modificou e tem outro peso em minha vida. Ter o básico para viver e ser respeitada apesar da minha condição física  tornaram-se fundamental.

Por isso, sou grata a Deus por ter pessoas, equipamentos e materiais que atendem minhas necessidades básicas. Só que, infelizmente, eu não sei ser meio termo, sou 8 ou 80 e quero mais. Primeiro e acima de tudo, eu quero ser vista como uma pessoa normal. Eu sou igual a você. Meu cognitivo é totalmente preservado. Segundo, eu quero ser respeitadas nas minhas vontades e negações, assim como você é.  Terceiro e, não menos importante, eu quero ter o direito de escolher o que é melhor para mim, mesmo que eu me lasque ou me arrependa depois, justamente como você faz. Isso é viver. Sinceramente, não acho que eu esteja pedindo muito. Insisto, eu sou igual a você.

Concordo que é difícil me ver como uma pessoa normal. Nossa sociedade não incentiva isso. Entretanto, é preciso treinar o nosso olhar. Para você ter ideia, tem gente que vem a minha casa e não vem ao meu quarto me cumprimentar, como se eu fosse uma moribunda. Bom, o que a qualidade de vida, pelo menos a minha, tem a ver com o sistema? Como disse sabiamente a Sandra Mota, na ELA, nós buscamos a estabilidade. Para nós, não perder é um ganho. Eu não tenho nenhuma expectativa de reabilitação, mas quero manter o que tenho o máximo de tempo. Isso é qualidade de vida. Para que isso seja possível, eu tenho uma equipe de profissionais que me atende. É aí que entra o sistema.  Na minha mente perturbada, eu acredito que um profissional de home care tem que ser diferenciado em relação a outras áreas da saúde, a começar pelo seu olhar em relação ao paciente. Afinal, poucos são os casos de reabilitação.

Estou enrolando, na verdade me contextualizando, porque quero contar algo que está acontecendo comigo e me deixando indignada. Meu fonoaudiólogo mudou. A que estava comigo há mais de um ano saiu por causa da rota. Entrou um novo  faz umas três semanas. Um belo dia, uma das técnicas conta para ele que eu tomava água, chupava pirulito e tomava caldo de feijão ou de carne todos os dias. Foi então que ele entrou no meu quarto e sem perguntar ou falar algo comigo, disse que eu estava proibida de ingerir qualquer coisa pela boca por causa do risco de broncoaspiração e, ainda disse, em um tom impositor, que não estava aqui  para reabilitar nada em mim. 

Entrei em estado de choque na hora. Primeiro, porque eu não sou retardada. O risco de broncoaspirar existe há mais de um ano quando fiz minha gtt. Segundo, ele fez terrorismo com as técnicas que trabalham aqui e elas se recusam a me dar qualquer coisa. Terceiro, ele não se preocupou em saber como o procedimento era realizado. Por último, eu melhor do que ninguém sei do que sou capaz e até onde posso ir.

O que eu esperava de um bom profissional¿ Que identificasse como o procedimento era realizado e me oferecesse soluções para que eu continuasse com a ingestão de líquidos da maneira mais segura possível. Eu não estou pedindo dois litros de água ou 500ml de caldo. Estou falando de 40ml de água ao longo do dia e de quatro ou cinco colheres de chá de caldo. Vocês não imaginam a luta interna, solitária e invisível aos olhos dos outros que travo diariamente para ter coragem de levantar da minha cama e fazer o que tenho que fazer. Como é difícil decidir tomar um caldo e me esforçar para isso, sabendo do risco da broncoaspiração.  Como é difícil optar pela vida quando a morte é bem mais fácil. O valor de sentir um gosto e ter um pequeno prazer quando você não tem nada. Para vir alguém e tirar tudo de você.

Vi um vídeo de um senhor com ELA, sem deglutição, tomando café porque gostava. Como ele fazia¿ A técnica de enfermagem jogava o café na boca dele e em seguida aspirava. Ele não engolia o café, mas tinha o prazer de sentir o gosto. Se eu não tenho profissionais que me ofertem essas soluções, eu quero pelo menos ter a liberdade de orientar as técnicas que trabalham comigo a fazerem coisas que me proporcionem prazer com segurança.

Como eu tomo água ou qualquer outro líquido com segurança? Eu peço para ser aspirada, minha cabeça é posicionada para frente. Quando o líquido é colocado na boca, eu o seguro e espero ele se misturar com a saliva e engulo. Uma parte desce e outra escorre, afinal eu tenho a limitação. Mas pelo menos, eu sinto o gosto. Ao final, peço para ser aspirada novamente.

Veja bem, não estou questionando o que o fono disse. Ele está certo. Questiono a postura dele, principalmente a de fazer terrorismo com minhas técnicas, impedindo-as de me dar qualquer coisa e de não me ofertar soluções que mantenham minha qualidade de vida. Além disso, em todas as sessões, ele quer massagear minha laringe, erguendo a cabeça para trás. Eu me negava a fazer o exercício e ele queria me obrigar. Toda vez, eu falo que a cabeça para trás aumenta o risco de broncoaspiraão e ele me ignora. Por que o risco aumenta? Essa posição deixa as vias aéreas abertas e faz com que toda saliva da minha boca, que é muita,  se acumule no fundo da garganta. Isso impede a passagem do ar e como tenho dificuldade para engolir, a saliva pode ir para o pulmão. Risco maior que ingerir qualquer coisa. Pois com a cabeça para trás, meu pulmão fica totalmente vulnerável.

Independente de qualquer coisa, nenhum profissional pode impor conduta ou tratamento sem a anuência do paciente ou da família. Ele deve sim dar o seu parecer técnico e, então, conversar com o paciente e sua família sobre as possibilidades. É muito difícil ir contra o sistema. Eu luto,e meesforço em ter mais qualidade de vida, só que sempre tem alguém me puxando para baixo. Dureza!só que eu não vou desistir.

Desculpem-me, mas eu me recuso a ser apenas um número de estatística. Eu insisto! Eu sou um ser humano que, como qualquer outro, merece ser visto e respeitado como tal. Essa é a minha luta! Conto com sua ajuda. Mude de atitude. Divulgue o meu texto.

Obrigada.

Beijo,
Dani.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

DECISÃO PELA TRAQUEOSTOMIA

Ontem, uma amiga me perguntou se eu estava ansiosa por causa da traqueostomia. Ainda não tinha parado para pensar nisso. Foi quando me dei conta de que estou muito mais que ansiosa. Estou com muito medo. Não pelo procedimento em si, mas sim pelo que está por vir.

A decisão pela traqueostomia não foi tomada de ontem para hoje. Há meses penso no assunto. Nesse período, cada visita médica era torturante porque eu sabia que o assunto ia vir à tona. Era algo inevitável, por mais que eu tentasse escapar. Eu ficava mal, com dor de barriga e tonturas quando alguém falava sobre traqueostomia. Uma coisa foi importante: todos os médicos que aqui vieram, respeitaram a minha vontade e o meu tempo.

Mas você conhece aquela história de que mudamos quando o novo comportamento incomoda menos que o antigo? Um exemplo simples: sempre odiei cabelo no rosto. Também odiava usar faixa ou tiara no cabelo, pois tenho cabeça e testa grandes. Enquanto me mexia, eu ficava tirando o cabelo do rosto. Depois que adoeci, isso ficou impossível. Ou eu ficava com o cabelo no rosto ou usava faixa ou tiara na cabeça. Constatei que, mesmo evidenciando minha cabeça, a faixa incomodava menos. Mudei e comecei a usar faixa. Claro que esse exemplo é simplista. Mas serve para outras áreas da nossa vida. Foi isso que aconteceu em relação a traqueostomia.Outras situações a que estou sendo submetida têm me causado tanto sofrimento que a traqueostomia se fez necessária.

Faz um ano e meio que uso o bipap 24h por dia. A máscara incomoda, mas eu estava levando. Tive duas grandes quedas de saturação, mas ainda estava levando. Foi quando começaram o excesso de salivação e o acúmulo de secreção na garganta. Aí minha vida virou um inferno. Falta de ar constante e sessões intermináveis de aspiração. Como a secreção se acumula na garganta, é necessário enfiar a sonda bem fundo. E vou te contar uma coisa, a maioria dos profissionais não sabe aspirar. Mas graças a Deus, tenho um fisioterapeuta e duas técnicas de enfermagem que sabem.

É aí que entra outro ponto. Para ser aspirada, é necessário tirar a máscara. Só que eu não aguento ficar muito tempo sem ela. Esse tira e põe da máscara me deixa fisicamente esgotada. É como se você tivesse que prender a respiração, várias vezes seguidas, durante uma hora. Eu não aguento mais. Muito sofrimento. Não acho que a traqueostomia vai diminuir a secreção, mas espero que facilite aspiração, uma vez que a sonda será introduzida direto na traqueia, tornando o procedimento mais rápido. Acredito que ainda terei falta de ar, pois continuarei dependente do ventilador para respirar. Só que em vez de ficar conectada à máscara, a mangueira do ventilador ficará conectada a minha traqueia.

Essa foi a decisão mais difícil da minha vida. É como ter que escolher entre merda e bosta. Ninguém quer ser traqueostomizado. É algo assustador para quem vê. As pessoas ao meu redor também terão que se adaptar ao meu novo visual. Eu descobri que me "escondo" por trás da máscara. Ela também tem seu benefício secundário. A máscara esconde a atrofia do meu rosto e a perda da minha expressão facial. Percebi isso quando vi um vídeo que o Alkinder fez de mim. Lembro-me bem do que estava sentindo quando fui filmada e não era algo bom. Eu estava com falta de ar e chorando, mas aparecia sorrindo. Foi muito difícil ver essa imagem. Enfim... Faz parte do processo da doença e vou ter que superar mais isso. Não há outra opção. Para isso, eu conto novamente com o apoio e orações da família e dos amigos.

Obrigada por ter aguentado meu desabafo. Este, mais terapêutico que os outros.

Beijo,
Dani.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

LUTO - NEGOCIAÇÃO - PARTE II

Continuando minhas histórias de luta e de fé em busca da cura.

Centro Espírita de Manaus
Eu fazia o ESDE -Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita na FEB. Minha professora, que é minha amiga até hoje, me apresentou uma colega de outra turma cuja filha havia sido curada de um problema pulmonar em um centro espírita em Manaus. Foram meses de conversa e explicações sobre o funcionamento do centro até eu resolver ir. Fomos eu e minha mãe. Um amigo do Alkinder muito querido, que morava em Manaus,  passeou conosco pela cidade e nos levou ao centro. Chegamos muito cedo: ficamos suando, digo, esperando até tudo começar. A médium da casa atendia incorporando um médico. Ela disse várias coisas, mas só me lembro da parte que disse que minha doença estava muito avançada e que ia ser difícil me ajudar. Acho que foi o único lugar em que ouvi a verdade. Mas de qualquer forma, eu faria o tratamento mais tarde no mesmo dia. Tive que tomar um banho de ervas e colocar uma roupa branca. Assistimos uma palestra e depois eu fui a um quarto cheio de camas. Deitei em uma das camas e fiquei lá por uma hora. Recebi passe, orações, e ainda fiz uma cirurgia espiritual. Como eu não poderia dar continuidade ao tratamento presencial, eles agendaram várias sessões de tratamento a distância. Durante mais de um ano, uma vez por mês, eu me recolhia ao meu quarto no horário agendado, durante uma hora. Gostei muito de lá. Se eu morasse em Manaus, eu teria frequentado o centro toda semana.

Centro Espírita Casa do Caminho - Juiz de Fora
Esse foi o penúltimo lugar que fui. Já não andava mais e não queria saber mais de nenhum lugar ou pessoa que fizesse cura. Eu sabia que se eu ouvisse falar de alguém, a fagulha da esperança se acenderia e eu iria atrás. Eis que a Rede Globo faz um Globo Repórter somente sobre curas. Evitei assistir o programa. Mas uma amiga me liga no dia seguinte me falando sobre esses centro de Juiz de Fora. Lá, a médium, D. Isabel, havia curado seu filho de esclerose múltipla com sessões de passes diários. Pesquisei sobre o centro e resolvi ir. O Alkinder estava de férias, pegamos o carro e fomos eu, Alkinder, meu pai e minha mãe. Foi uma viagem muito difícil porque eu já estava muito debilitada. Os lugares não são preparados para receber cadeirantes. Sofri um bocado. Mas a causa era nobre. Já que íamos até Juiz de Fora, programamos uma parada no Rio e em Resende para visitarmos meus irmãos. Primeiro trecho: Brasília - Belo Horizonte, só para eu poder descansar. Dia seguinte: Belo Horizonte - Juiz de Fora. Fomos ao centro. O lugar estava lotado. Era um salão grande, cheio de gente. Muita gente doente. Meus pais foram a tarde para colocar meu nome na lista de atendimento. No horário marcado começou a palestra com a D. Isabel. Logo depois, começam os atendimentos. Chamavam as pessoas pelo nome. Entramos em uma sala pequena e escura. Éramos umas dez pessoas. Umas oito na maca e duas na cadeira de rodas. Colocaram uma gravação da D. Isabel fazendo uma oração. Logo depois, D. Isabel deu um passe em cada um. Tomamos água fluidificada e saímos da sala. Só isso. De Juiz de Fora, fomos ao Rio e a Resende. O total de uma semana. Na volta, paramos em Juiz de Fora onde passei pelo mesmo processo. Com a diferença que, nessa segunda vez, fui abordada por uma moça ao sair da sala do passe. Ela trabalhava no centro e, como tinha me visto lá na semana anterior, queria me entrevistar. Ela me fez várias perguntas, mas uma me marcou. Não pela pergunta e sim, pela fisionomia da moça ao ouvir minha resposta. Ela me perguntou por que eu tinha ido ao centro. Eu lhe disse que tinha ido em busca da cura. Nesse momento, o rosto dela se transformou e me senti uma idiota por alguns instantes. Eu tinha tanta fé, mas a moça que trabalhava lá não acreditava que era possível. Enfim... Voltei para casa um pouco frustrada. Mas gostei muito de lá. Recomendo!

Seu Valentim - Gama DF
Foi logo no início da doença. Lembro que eu fiquei impressionada com a quantidade de pessoas. Muita gente, muita falação e muita confusão. É um lugar onde você encontra todo tipo de pessoas, do mais pobre ao mais rico. Uma vez, eu vi o Paulo Octávio lá - trata-se de um empresário e político do DF. O atendimento era por ordem de chegada. Para quem estava na fila, o atendimento só começava as 10h, mas eles abriam as 7h. O tempo todo tinha alguém pedindo dinheiro. Quando o atendimento começava, a gente deitava na maca. Seu Valentim, que parecia incorporado, encostava uma tesoura na nossa barriga e pronto. A gente se levantava e ia embora. Depois de ir algumas vezes, me colocaram no grupo de doenças mais graves. Quem participava desse grupo, tinha que chegar até as 7h e ficar no salão principal até as 10h, para absorver a energia do local. Depois das 10h, a gente passava pelo mesmo atendimento com a tesoura. Eu fui lá durante meses, três vezes por semana. No tempo em que frequentei o local, eu não vi nenhum momento de oração. Na época, o Seu Valentim tinha a ajuda de uma médica cirurgiã plástica, apelidada de Xerifa. Uma vez, eu fui com uma camisa da FEB - Federação Espírita Brasileira. Quando a Xerifa viu a camisa, ela começou a gritar que era de lá que vinha minha doença.Ela incorporou ou fingiu que incorporou um espírito obsessor. Ficou se contorcendo e gemendo, como se fosse um monstro. Depois, me disse que eu tinha que parar de frequentar a FEB. Desde esse dia, eu não voltei mais lá. Achei um absurdo! Fora que eu acho que devemos frequentar lugares que nos levam a Deus. Enfim. Só gostaria de deixar claro que eu fui em Seu Valentim em 2009. Não sei como funciona o atendimento lá depois de tantos anos.

Ainda tenho outras histórias que serão compartilhadas em outros posts. É isso!

Obrigada.
Beijo,
Dani.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

UM ANO DE BLOG

Este mês, meu blog faz um ano. Posso dizer que, no que tange aos objetivos propostos, ele é um sucesso. Na verdade, quem me sugeriu fazer um blog foi meu marido. Confesso que minhas pretensões eram poucas. Eu só queria compartilhar minhas vivências como portadora de ElA e, principalmente, minhas ideias malucas. Eu também tinha um medo gigante do fracasso e da rejeição. Mas o negócio tomou uma proporção que eu nunca imaginei.

Quando eu comecei a escrever, eu ainda falava. Bem baixinho, mas falava. Eu já tinha o computador adaptado, mas eu estava em fase de adaptação. Os primeiros posts foram ditados para minhas técnicas e cuidadoras e digitados pelo Alkinder. A medida que fui aprendendo a mexer no computador, fui ganhando autonomia no blog. Até o dia em que perdi totalmente a voz e tive que digitar sozinha os meus textos.

Quando escrevo, eu sou 100% emoção. Procuro não racionalizar. Eu gosto de escrever o texto de uma vez só. Do início ao fim, sem parar. Acho que perco em conteúdo quando escrevo em partes. Além disso, por uma limitação do sistema que uso ou minha, fica muito difícil corrigir algo que já escrevi. Por isso, meus textos apresentam alguns erros de digitação e nenhum rebuscamento.

Hoje, meu blog tem quase 37.000 visualizações. Tive posts que foram lidos por mais de 1.400 pessoas. Percebi que muitos leem o que escrevo pelo título. Outros leem tudo que escrevo e sempre comentam. Aliás, eu adoro os comentários. Os textos menos lidos foram os de dezembro, talvez pela época do ano. E eu acho que se eu não tivesse ficado um tempo sem escrever, o meu blog teria mais visualizações.

Como eu disse mais acima, minhas pretensões eram poucas quando iniciei o blog. Entretanto, foi a melhor coisa que eu poderia ter feito por mim. Porque ocupa meu tempo e, acima de tudo, minha mente. Além disso, é uma forma que tenho de elaborar psicologicamente tudo que sinto. Fora tudo isso, por causa do blog, eu tive a oportunidade de conhecer novas pessoas e rever outras. Tive críticas positivas e negativas. E aprendi a ser um ser humano melhor.

Posso afirmar uma coisa, a obtenção de todos esses benefícios foram por sua causa. Porque você está me acompanhando e me apoiando. Isso é muito importante para mim. 

Aqui, as minhas palavras são eternizadas. E meu desejo é que eu consiga escrever até o fim dos meus dias.

Obrigada por me acompanhar!

Beijo,
Dani. 

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

LUTO - NEGOCIAÇÃO

Gostaria de compartilhar com vocês outra fase da minha vida. Vou voltar às fases do luto. Hoje, falarei da negociação. Só para lembrar, o luto tem cinco fases: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação.

Na Negociação, há a barganha com Deus. Como eu barganhei! Se alguém me falasse que o fulano fazia cura, lá nós estávamos, eu e minha mãe. Muitas vezes o Alkinder foi, mas ele ia por mim, pois não acreditava. Já eu, acreditava tanto que cheguei a crer que seria possível, que Deus me curaria! Na hora do desespero, fazemos qualquer coisa. Pode acreditar! Fui a igreja católica, igreja evangélica, centro espírita kardecista, candomblé e umbanda. Ah, fui também em lugares laicos. Fui ajudada, enganada e iludida. Contarei a vocês! A ideia é contar tudo em vários posts porque são muitas histórias. Assumo que algumas são absurdas. Ao ler, lembre-se do desespero do meu ser.

Igreja evangélica:
Eu ainda andava e fui ao dentista fazer clareamento dental. O Alkinder tinha comprado o pacote para mim no Groupon. Quando a dentista viu que eu estava doente, disse que era evangélica e que na semana seguinte haveria, em sua igreja, um culto de cura, com um pastor de fora. Na hora agradeci e não dei importância. Mas, no dia, fiquei louca. Me deu vontade de ir, só que eu não tinha o endereço da igreja. Só sabia que ela ficava em Águas Claras. Liguei para todas as igrejas evangélicas de Águas Claras até achar aquela que a dentista havia me descrito. Fomos eu, meu pai e minha mãe. Demoramos mais de 1h para achar a igreja. Chegamos no meio do culto. A dentista me viu e me recebeu super bem. Sentamos e ficamos ouvindo o pastor vindo de Curitiba. Quase no final do culto veio a oração de cura. Logo depois, o pastor começou a pedir dinheiro para os fiéis para pagar o hotel dele. Ele falou que não era caro, só R$ 3.500,00, divididos em 3x no cartão. Ninguém se ofereceu para pagar, apesar da sua insistência. Daí, ele falou de um DVD que ele havia produzido. Disse que não tinha vendido nenhum e que ele tinha resumido o conhecimento de cinco anos de faculdade em três DVDs, de apenas R$ 45,00. Ele disse, ainda, que quem comprasse os DVDs teria uma bênção financeira - teria uma promoção, ganharia algum dinheiro ou algo do  tipo. Quando o culto acabou, a dentista, constrangida, apresentou-me o pastor que ungiu a minha testa com azeite. Agradecemos e fomos embora. Lá fora, vimos a barraca que vendia os DVDs. Estava LOTADA!

Candomblé:
Não lembro como chegamos a procurar o candomblé. Só me lembro que a indicação era quente. A tal mãe de santo resolvia todos os problemas do povo do Senado. Minha mãe foi primeiro e fez uma consulta que foi paga. A mãe de santo disse que tinham feito um "trabalho" para mim e que era por isso que eu estava doente. Para desmanchar o tal "trabalho", ela cobraria R$ 800,00. Entrei em desespero porque eu acreditei nela e não tinha dinheiro para pagar. Quando consegui o dinheiro, eu fui desmanchar o "trabalho". Era em um centro para lá de Valparaíso. Enfim, a mãe de santo pediu que eu fosse de roupa velha. Fomos à área externa do centro. Pediram para eu fechar os olhos e não abrir de jeito nenhum. Lógico que eu olhei e o que eu vi não parecia valer os R$ 800,00. Tudo bem que tinha a parte da mulher... Bom, ela colocou algumas travessas com comida ao meu redor. A cara e o cheiro estavam ótimos. Ela começou a cantar e a jogar a comida em mim. No final, para encerrar a performance, ela tocou fogo em um punhado de pólvora, pediu para eu tomar um banho de ervas e jogar a roupa fora. Antes de irmos, ela disse que eu teria que ficar isolada e sem comer carne por sete dias. E que, ao final do sétimo dia, eu teria que dar um brinquedo para sete crianças e comida para sete pessoas. Assim o fiz. Comprei brinquedo, arroz e feijão. Resumo da história: se aproveitaram da minha ignorância e do meu desespero para me enganar. No dia em que fui ao centro, eu saí de lá sentindo que tinha algo errado. mas mesmo assim dei continuidade às orientações da mãe de santo. Eu precisava de uma esperança, mesmo que falsa! Pelo menos, fiz sete crianças e sete pessoas felizes. Na maior parte das vezes, nós acreditamos que há situações que nunca acontecerão conosco. Mas acredite! Acontece!

Em breve haverá novas histórias.

Beijo,
Dani.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Cadáver!?

Nesse último sábado, uma das técnicas de enfermagem que cuida de mim teve o pai acidentado e não veio trabalhar. A empresa que presta o serviço, no meu caso a Unisaúde, enviou uma cobertura, ou seja, uma outra técnica para substituir a que faltou. É muito ruim ter cobertura porque a pessoa que vem não conhece minha rotina e nem a mim.

A mulher chegou super mal educada. Ignorou-me o tempo todo. Disse que sabia tudo; afinal, tinha 18 anos de experiência. Mas não conseguiu fazer a medicação pela gtt e, muito menos, me aspirar. E gente, gtt e aspiração são procedimentos básicos de enfermagem. No final das contas, minha cuidadora, que nunca tinha me aspirado, teve que fazê-lo. Aliás, foi ela que me salvou.

Para completar, a mulher saiu daqui dizendo que eu era um cadáver e que por isso, as coisas tinham que ser do jeito dela e não do meu. Fiquei pensando que tipo de cadáver eu sou. Cheguei a conclusão que eu sou o pior deles porque eu penso e sinto. Realmente, eu devo ser assustadora para pessoas de mente pequena e imbecilizadas. Claro que eu me torno um cadáver quando percebo as falhas de uma pessoa que se diz tão perfeita.

Gostaria de dizer que eu sou igual a você. Uma pessoa normal. Com sonhos, desejos, medos e inseguranças. O mínimo que todo mundo merece é respeito. Eu também. E não é porque eu estou doente e sim porque sou um ser humano.

Este post é um desabafo. Estou cansada de ser desrespeitada por profissional despreparado, de ver as coisas se repetirem e nada mudar. Fiquei muito chocada com a postura da mulher e grata pela equipe que eu tenho. É isso.

Beijo,
Dani.