Família

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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

ANO NOVO REALMENTE NOVO

O que é um ano novo? Para mim é uma convenção que funciona. Pesquisei que foi o imperador romano Júlio César que decretou o dia primeiro de janeiro como dia do ano novo por causa do Deus Jano,  O deus dos portões. Ele tem duas faces. Uma para frente, voltada para o futuro e outra para trás, voltada para o passado. Enfim, o dia do ano novo pode variar conforme outras culturas ou religiões. Mas uma coisa é única: renovação da esperança. Por isso digo que é uma convenção que funciona. Parece que nessa época do ano, nós somos imbuídos de sentimentos nobres. Parece que ganhamos força e conseguimos pegar um fôlego para continuarmos a nadar nesse mar que se chama vida.

Carlos Drummond disse que quem teve a ideia de dividir o ano em fatias, industrializou a esperança. Porque doze meses são suficientes para levar a pessoa à exaustão. Aí vem o ano novo e nos enche de esperança. Concordo com ele. Não sei onde começou essa superstição - sim, eu acho que é uma superstição - mas funciona assim mesmo.

 Confesso que eu perdi um pouco disso, mais embaixo vou dizer o porquê. Posso afirmar que 2014 foi o ano mais difícil da minha vida. Ao mesmo tempo foi o pior e o melhor. Eu descobri que o ser humano pode ser incrível, mas também pode ser abominável. E muito do modo como ele vai se comportar depende dos seus interesses. Perdi um pouco o brilho dos olhos por um lado, mas ganhei por outro. Tive desencontros, encontros e reencontros maravilhosos. Conheci pessoas incríveis e pude ver como o ser humano pode ser bom, caridoso e altruísta. O saldo foi positivo. Até porque o que não mata, fortalece. Queria conseguir citar o nome de todos que contribuíram para o meu bem estar, a minha felicidade e o meu fortalecimento. Mas o medo de esquecer alguém não me permite. Só que devo destacar dois eventos especiais: a volta do meu irmão Fábio a Brasília, por minha causa e o reencontro da família Silva.

Bom, mais acima eu disse que havia perdido o sentimento de esperança no ano novo. Há dois motivos. Primeiro, eu sei que 2015 será mais difícil ainda. E eu conto com a ajuda, o apoio e as orações de todos. Segundo, porque minha esperança não precisa mais de dia marcado para ser renovada. Tenho que ser forte todos os dias. Preciso renovar minha esperança todos os dias.

E é esse o recado que quero deixar aqui. Quer um ano realmente novo? comemore hoje, mas permita que a alegria, a força, a fé e a esperança sentidas e vivenciadas hoje perdure por todo o ano. Não se limite ao hoje. A vida é o nosso limite!

Obrigada por terem me acompanhado e por fazerem parte da minha vida.

Um agradecimento especial ao meus pais, meus irmãos e ao Alkinder.

Feliz ano novo todos os dias.

Beijo,
Dani.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

O NATAL

Meu natal foi perfeito. A ida a casa da minha mãe foi mágica. Meus pais e meu irmão Fabio prepararam toda a casa. Teve reforma no banheiro, mudanças na fiação, cortina para eu ter mais privacidade, enfim, pensaram em cada detalhe. Eu optei por ficar na sala porque queria participar de tudo. No quarto, eu ficaria isolada. A remoção de ambulância foi estressante, mas sobrevivi. Durante minha estadia lá, eu ainda tive a presença dos meus irmãos, Andrei e Thiago, da minha cunhada Paula e das minhas sobrinhas, Luiza e Bianca. O que me deixou muito feliz.

Bom, a noite de natal. Depois de anos, reunimos toda a família Silva. Todos mesmo. Pais, irmãos, sobrinhas, avó, tios e primos. Até meu padrinho foi. Também tivemos a companhia da família da Paula e do meu amigo André. Rezei, agradeci, cantei, chorei, conversei, ri, chorei de rir e me diverti. Ganhei muitos presentes. Mas meu maior presente foi ter todo mundo reunido e ver o brilho de emoção e felicidade nos olhos de cada um. A doença me ensinou a ler os olhos do outro. E isso é muito bom porque eu preciso de pouco para entender alguém. E eu vi os olhares ternos de todos. Também ouvi a Bianca gritando "presente" logo após nossa cantoria porque estava doida para abrir os presentes. Uma graça. E além disso tudo, ainda pude ver a Luiza e a Bianca distribuindo os presentes, vestidas de mamãe noel. Foi muito gratificante ver o esforço de cada um para estarmos juntos. E é isso que faz a diferença na nossa vida: dedicação. Sou grata a Deus por ter tanta gente que se dedica a mim.

Tudo isso vai ficar marcado em meu coração para sempre. Foi muita emoção. Confesso que teve um momento em que fiquei revoltada por estar doente e não poder aproveitar o momento como eu gostaria. Mas, ao mesmo tempo, eu sei que tudo isso só existiu por causa da ELA. Se não fosse a doença, provavelmente, a família Silva não estaria reunida. Provavelmente, o natal teria sido bom, mas não teria sido especial. Felizmente, a doença me proporciona coisas boas também. Na verdade, é o benefício secundário da doença.

Confesso, ainda, que o processo de deixar a minha casa e o meu marido para ir a casa da minha mãe foi difícil. Assim como o processo de volta, de deixar minha mãe e voltar para casa. Pode parecer algo simples, mas não é. Envolve muitos sentimentos, medos e inseguranças. Foi tudo muito intenso. Mas posso dizer uma coisa : cada segundo valeu a pena, seja pelo que vivi, experimentei e senti. E isso tudo só aconteceu porque eu tive a ajuda, o apoio e o incentivo dos meus pais, do Fabio e do Alkinder.  

Um destaque: minha mãe fez um banner lindo com fotos do natal de 2011. Último natal que eu havia passado com meus pais e meus irmãos. Ficou lindo. Adorei.

Espero que o natal de todos tenha sido especial também. Obrigada àqueles que estiveram ao meu lado e me proporcionaram Esses momentos felizes. 

Obrigada pai, mãe, Fabio e Alkinder. Amo vocês.

Beijo,
Dani.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

CORAL ELETRONORTE

Sempre gostei de coral. Pessoas reunidas para um bem comum me fascinava. E a música? Ah, a música... Para mim, tem o poder de regenerar a alma. Sonhava em cantar em um coral. Mas quando tentei, o maestro disse que minha voz era horrível. Fora que eu queria ser soprano, mas minha voz era contralto. Enfim, sonho engavetado. Só que o fascínio continuava.

Minha prima que trabalha na Eletronorte  fez o contato. Disse que o coral quEria vir aqui. Fiquei feliz e lisonjeada. Seria maravilhoso recebÊ-los. Divulguei para alguns vizinhos que vieram. O pessoal chegou tímido, mas havia uma luz, uma ótima energia. Eles trouxeram teclado e outros instrumentos. Não acreditei. Quando começaram a cantar, a emoção tomou conta de todos nós. Achei que alguns não conseguiriam cantar. Mas como eu disse, a música regenera a alma. Mais do que lindas vozes, eu vi olhares repletos de ternura e afetuosidade. Na hora, agradeci a Deus pelo momento. Aí, eu pensei como eu era privilegiada. Quanto carinho eu recebi. E vou falar uma coisa, momentos assim não têm preço.

Começaram com músicas de natal, depois samba e outras mais. Por mim, ficavam aqui para sempre. Mas teve que terminar. Deixaram um gostinho de quero mais. Bom assim! Gostaria de agradecer a Elaine por ter tido a ideia de vir e aos demais por terem aceitado. Vocês marcaram minha vida, não só pelo que vi e ouvi, mas pelo que senti. obrigada por esse presente. E eu que estava triste por vários motivos, fiquei feliz.

Antes que eu me esqueça, Edite, vou esperar o cineminha com a nossa peça de teatro!

Para quem não sabe, trabalhei na Eletronorte, como terceirizada, no período de março de 2005 a março de 2006.

Obrigada! Obrigada! Obrigada!
Beijo e feliz natal!
Dani. 

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Parece, mas não é!

Muita coisa parece, mas não é. Flor de plástico parece de verdade, mas não é. A esclerose lateral amiotrófica - ELA parece morte, mas não é.

Apesar de morrermos um pouco, afinal toda transformação significa a morte do que se foi, nós não estamos mortos. Pelo contrário! Confesso que nunca estive tão viva. A medicina insiste em afirmar que o que temos é sobrevida. Ouso em dizer que esse julgamento está equivocado. Concordo que nossa rotina não é fácil, pois lutamos contra a maré. São aspirações, dificuldades para urinar e defecar, perda do pudor, fora as sessões de fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, etc...

Tudo isso para tardar o inevitável, a morte. Mas, apesar disso, eu nunca estive tão viva, meus sentimentos e percepções nunca estiveram tão aguçados e minha mente nunca esteve tão lúcida. Realmente, não mexo meus músculos, mas aprendi a ver a vida de outra forma, às vezes, pelo reflexo de um espelho. Acredito que a proximidade da morte pode em um primeiro momento parecer o fim. Mas com o tempo, nós percebemos que é o começo de uma nova pessoa. Mais corajosa. Mais resistente. Mais fria. Mais humana. Quem sabe? A transformação é individual. Mas a profundidade é tamanha que, por vezes, parece irreversível. E, amigo, só muda quem está vivo.

Beijo,
Dani.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

OS DESAFIOS DA BOA COMUNICAÇÃO

Sinceramente, nunca imaginei que um dia estaria aqui falando sobre comunicação. Eu que, por tantas vezes, tentei ajudar algumas pessoas a se comunicar melhor por meio de treinamentos que ministrei. Hoje não pretendo falar de teorias e sim da árdua experiência de me fazer ser entendida diariamente. Tudo que eu falar aqui é baseado na minha experiência de todo o processo de perda da fala.

Primeiro ponto importante, independente do meio utilizado, tanto o emissor quanto o receptor têm que desejar a comunicação. Porque só a vontade de se comunicar propiciará que haja atenção no que está sendo compartilhado. Atenção é o segundo ponto importante. Quando não temos atenção no que fazemos, a possibilidade do erro é muito maior, independente de qual seja a atividade. A atenção no que está sendo transmitido aumenta a possibilidade de compreensão da mensagem. Terceiro ponto importante é paciência para obter a mensagem até o final. Se não tivermos paciência para receber a mensagem até o final, a comunicação será incompleta e, consequentemente, falha.

Apesar de todas as dificuldades, quando utilizamos a fala, a comunicação se torna menos complicada, visto que nossas emoções vêm impressas nela. Quando falamos, há a altura e o tom de voz, além da nossa postura corporal e gestos que facilitam o entendimento da mensagem.

Considerando a sua experiência de vida e tudo que escrevi aqui, imaginem o que uma pessoa como eu, que não fala, não se mexe, possui pouquíssima ou nenhuma expressão facial, mantém sua inteligência, sua lucidez e toda sua experiência de vida viva sofre para ser compreendida?

Tenho a humildade de dizer que ainda estou aprendendo. Afinal, a boa comunicação é um desafio em qualquer situação. E descobri que para cada personalidade, para cada condição social, para cada condição cultural, enfim, para cada pessoa, é necessária uma forma diferente de se comunicar.

A minha jornada para me expressar sem a fala começou com uma pasta de comunicação fornecida por um paciente e aprimorada pela minha terapeuta ocupacional. Confesso que a pasta limitava as minhas possibilidades de fala. Foi quando minha mãe arrumou alguns alfabetos impressos. Escolhi aquele que me pareceu mais fácil. Assim como a pasta de comunicação, ele também foi adequado As  minhas necessidades pela minha terapeuta ocupacional. Surgiu, então, uma nova forma de me comunicar. As pessoas falavam as letras e eu piscava para aquelas que eu queria usar.  Mas eu tinha que persistir, pois a comunicação era lenta e algumas pessoas não tinham paciência de conversar comigo. Caí no abismo do silêncio. Foi muito difícil e triste. Mas eu tinha uma técnica de enfermagem que se esforçava para entender o que eu ainda falava e que me ajudou muito a não entrar em uma depressão profunda. Foi quando eu tive acesso a outro meio de comunicação mais rápido e eficaz.
Eu me considero uma pessoa de sorte e abençoada por Deus, porque tenho um computador adaptado que me permite digitar e acessar a internet somente com os movimentos dos olhos. Esse computador me foi emprestado. Pertencia a outro paciente de ELA, e quando ele faleceu, veio para mim. Quando eu falecer, ele irá para outra pessoa e assim vai. Costumo dizer que esse equipamento é uma extensão do meu corpo. Ele me trouxe de volta à vida quando me possibilitou o acesso às redes sociais e o contato com as pessoas, tanto virtual, quanto presencialmente. Ele me deu voz quando tudo era silêncio. Por isso, tenho tanto apego. Sem ele, sinto-me nua e desprotegida.

Mas como nem tudo são flores, junto com o computador veio o desafio da comunicação escrita. Tardiamente, dei-me conta que a educação brasileira só ensina as pessoas a juntar as letras e repetir as palavras. Não ensina a interpretar o que foi lido. Percebi que, infelizmente, muitas pessoas não entendem o que está escrito. Muito triste. Foi quando eu percebi que a entonação do que falo é dada pela pontuação que uso e que tenho que estar atenta a isso, assim como aqueles que leem o que escrevo. Notei, também, que meu vocabulário tem que ser adequado para cada pessoa e me dei conta que, em alguns casos, a comunicação é inviável, porque todas as vezes há ruídos na mensagem e, consequentemente, muito estresse. Também redescobri o prazer de conversar e compartilhar a vida com aqueles que amo. É aí que vejo como as conversas fluem e que vale a pena eu me esforçar para ter esses momentos de prazer. Simplesmente porque eu me sinto mais feliz em compartilhar.

Eu sou lúcida e me sinto respeitada quando profissionais como nutricionista, fono, fisio ou enfermeira me perguntam o que sinto e discutem comigo as opções de tratamento. Sinto-me viva. Tenho, também, a possibilidade de definir minha rotina e alterá-la quando for importante para mim. Mesmo sem voz, eu consigo ser ouvida e isso me traz paz e segurança de uma sobrevida menos sofrida.

Infelizmente, sei que a compreensão do que sinto muitas vezes é difícil. Mas não me canso de falar, pois aprendi que a repetição é necessária para uma boa comunicação!

Beijo,
Dani

terça-feira, 1 de julho de 2014

SER DOENTE x MORTE

Receber visita é sempre bom! Ver e ter notícias daqueles que amamos é revigorante. Agora não sou hipócrita. Sei que é difícil para as pessoas me verem como estou. Só que não acho que o meu estado físico seja motivo para não receber visitas ou para não virem me visitar.

Ver pessoas doentes se chama vida e viver implica em ter e ver momentos bons e ruins.A não ser que tenhamos uma morte fulminante, todos nós passaremos por isso. Não escaparemos de um leito de hospital ou UTI, nem nossos pais, nossos irmãos ou nossos filhos. Eu acredito que a diferença está no tempo que isso perdurará. Como eu sempre digo, sortudos daqueles que sofrem pouco, cujas experiências de vida não exigem muito do espírito para a sua evolução. Boas almas! Já eu, se fosse boa tinha morrido menina para virar anjo. Rsrsrs...

Confesso que quando eu escuto alguém dizer 'fulano tem 10 anos de ELA, beltrano tem 15 anos", eu  fico arrasada. Não pela pessoa. Se ela está feliz, fico feliz por ela. Mas, fico arrasada por mim, pois não quero viver tanto. Pacientes com doenças graves e raras que causam alguma limitação, para a medicina, não têm vida, e sim sobrevida. E pessoal, desculpe-me, mas não quero sobreviver. Sei que a escolha não é minha, mas não quero. Até porque não acho que a morte seja algo ruim. Acho que o momento exato em que ela ocorre deve dar um frio na barriga, tipo o que a gente sente em montanha russa.Já que não sabemos o que acontecerá na sequência. Mas, depois desse medo inicial, deve vir uma boa sensação.

A morte é ruim para quem fica que terá que aprender a viver sem a companhia de quem ama. Agora, acredito que para quem vai, a morte é uma libertação para o espírito que não precisará mais padecer das mazelas do corpo e dessa vida. Quando for a minha hora, podem ter certeza que irei em paz porque me libertarei dessa vida de sofrimento e, principalmente, libertarei meus pais e meu marido. Afinal, é melhor ser lembrança, do que culpa ou estorvo.

Sempre peço a Deus paz, harmonia, força, discernimento para fazer o que é certo e humildade para aprender e me tornar uma pessoa melhor. Tomara que eu tenha sucesso e não sucumba nessa minha "prova", pois não quero voltar e ter que passar por tudo de novo. Afinal, é melhor passar de ano direto, sem recuperação, não é?

Beijos,
Dani.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

RESPONSABILIDADE

Estava me lembrando do dia em que aprendi, na prática, o conceito de responsabilidade.

Estávamos eu, a Lu, o tio Cesar e a Luange na casa da minha avó. Eu tinha uns 16 anos, a Lu 14 e a Luange uns 4. O tio Cesar precisou dar uma saída rápida e eu pedi para que a Luange ficasse conosco. Foi quando ele perguntou quem ficaria responsável por ela. Eu, na minha inocência, disse que ficaria responsável. Para o meu azar, a menina tropeçou e caiu de  cara nos fios da televisão, ficando com o rosto marcado. Meu tio chegou e chamou a minha atenção. Naquele dia, eu aprendi o que era responsabilidade. Foi uma experiência traumática, mas educadora.

A experiência valeu a pena porque pude entender que responsabilidade é compreender que nossos atos e escolhas têm consequências e que para sermos pessoas de bom caráter, nós temos que assumí-las e se, de algum modo, avocamos a responsabilidade para nós, maior ela fica, não tem jeito! Levei esse aprendizado para a vida e me tornei uma pessoa melhor, mais consciente dos meus atos e muito mais responsável.

Eu não queria que a Luange tivesse caído, mas aconteceu e eu era a responsável. De  algum modo, eu negligenciei. Bom, ainda bem que só foi um susto e ela não se machucou. A marca do fio ficou em seu rosto porque ela era uma bochechudinha linda, assim como é hoje.

Beijos,
Dani.

sábado, 7 de junho de 2014

Onde se acha a felicidade?

Como disse Guimarães Rosa, a felicidade se encontra em momentos de descuido. E ontem, eu tive  um momento de descuido daqueles! Pena que a felicidade nunca é completa.

A vida tem me proporcionado várias descobertas e redescobertas, vários encontros, desencontros e, principalmente reencontros maravilhosos. Redescobri e reencontrei o amor da família do meu pai. Não sei se consigo expressar o quão importante é isso. Mas, nós, por burrices da vida, ficamos um tempo afastados. Tempo triste e solitário... a minha vida era eles, principalmente as minhas primas Ale e Lu e a minha tia Vera. Nós não éramos só parentes, nós éramos unha e cutícula, pão com manteiga, queijo com goiabada, enfim, melhores amigas. E o meu primo Junior? Ele sempre era o meu marido nas brincadeiras. Rsrsrs... E as nossas férias no Rio de Janeiro? Íamos todos. O apartamento de dois quartos ficava lotado. Jogávamos gelo nos vizinhos do prédio ao lado. Rsrsrs... brigávamos, mas no final fazíamos as pazes. Já briguei de  porrada com a Lu. Ela disse que não se lembra. Melhor assim, né?! E os nossos natais? Sempre especiais e com feijoada. Isso mesmo, feijoada! E as rabanadas da minha avó? Delícia! São tantas histórias!

Tudo isso para dizer que ontem a minha família veio me visitar. Todos os tios e primas  reunidos. Faltou a minha avó. Se ela tivesse vindo, eu ofereceria a ela café com leite condensado. Ela adorava e já tomava essa bebida antes da Fnac colocá-la no cardápio pelo preço absurdo.

Mas, afinal, onde achamos a felicidade? Para mim, a felicidade está naqueles que amamos, em estar com eles e em vê-los felizes. E ontem, a minha felicidade esteve na presença do tio Cesar, tia Vera, Luange, Ale, Lu, Fernanda, meus pais, meus sogros e meu irmão Fábio. Que bagunça boa! Dormi feliz.

Beijos,
Dani.

domingo, 1 de junho de 2014

FILHOS

Eu sempre quis ser mãe. Na época, eu não sabia o porquê, só sabia que tinha muito medo da responsabilidade, pois eu teria que abrir mão da minha vida por outra pessoa, e, egoísta como eu era, ter um filho seria um pouco difícil. Meu casamento era tão bom, tão sem compromissos, saíamos a vontade sem hora para chegar, viajávamos, enfim, levávamos uma boa vida de recém-casados. Ainda assim, eu queria ser mãe, talvez, por pressão social.

Como vocês já leram, eu tive um aborto no final do ano de 2008, juntamente com o início dos sintomas da doença. Eu sofri muito, e não entendia porque Deus tinha tirado a oportunidade de ter um filho em um momento tão difícil da minha vida, no qual eu estava doente e ainda não sabia o que tinha. Eu pensava que um filho naquele momento nos traria felicidade, mas hoje eu entendo. Imagina eu, na situação em que me encontro, com um filho de 5 anos. Eu iria sofrer muito mais por saber que eu não poderia acompanhar seu crescimento. Já sofro por causa dos meus sobrinhos, imagine como seria com um filho.

Em certa ocasião, pedi desculpas à minha sogra por não poder dar-lhe netos. Ela me surpreendeu me consolando que não tinha problema, que inclusive muitos casais de hoje optam por não terem filhos. A minha mãe, falando sobre o assunto, disse-me que se ainda tivesse útero, geraria um filho para mim. Coisa de mãe! Também, eu só confiaria esse tipo de coisa a ela ou a uma irmã, se eu tivesse uma. Bom, tive muitas conversas sobre o assunto, principalmente com o meu marido. Foi difícil para nós nos conformarmos com isso. Acho que para ele foi mais difícil. Só que hoje o nosso pensamento mudou. Temos tantos problemas, como por exemplo, manter-me viva, que talvez a ausência de um filho perdeu a sua importância.

Na verdade, eu acho que foi melhor assim. Acho que eu e o Alkinder não temos mesmo perfil para sermos pais, acho que não temos muita paciência e não construímos a nossa casa pensando em crianças: tem muitos vidros, quinas, móveis baixos, piscina, etc... Fora que a minha doença nos toma muito tempo, muito mais do que tomaria um filho, quem sabe.

Entretanto, a impossibilidade de ser mãe me gerou muitas reflexões, algumas delas provavelmente nem teriam passado pela minha cabeça se eu tivesse experimentado a maternidade. Percebi que algumas pessoas criam os filhos para serem bem sucedidos. Outras, menos materialistas, criam simplesmente para serem felizes. Mas, como ninguém pode garantir a felicidade de um filho, nem que rumo sua vida tomará, eu pude entender que ser mãe é um ato de coragem e plena doação, pois ela produz e cuida de algo que não é dela e sim do mundo! Infeliz da mãe que não pratica esse desapego! Deve ser tão difícil.

Eu ainda pude entender em todo esse contexto que o papel de pai e mãe é formar pessoas de bem, de bom caráter. Os pais têm que preparar os filhos para a vida, impor limites e aparar as arestas das más tendências. E se eles fracassarem, serão julgados, condenados e massacrados pela sociedade, por melhores que tenham sido. Mas, também, amarão e serão amados incondicionalmente, por pior que pareça a situação.

De qualquer modo, independente de alegrias, tristezas e dificuldades, acredito que o melhor papel de uma mulher é o de mãe. Quem sabe na próxima encarnação!!!??? Afinal, "que coisa louca, que coisa linda que os filhos são", escreveu o sábio Vinícius de Moraes.

Beijos,
Dani
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Poema enjoadinho

Filhos...Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Se não os temos
Que de consulta

Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
Vinícius de Moraes
(1913-1980)

segunda-feira, 26 de maio de 2014

O VALOR DO TRABALHO

Acredito que as pessoas que trabalham somente pelo dinheiro devem ser muito infelizes. No meu ponto de vista, o dinheiro é útil e importante para o nosso bem estar e conforto, mas não é tudo.

O trabalho é a lei da vida. Por meio do nosso trabalho, nos desenvolvemos e crescemos como seres humanos e desenvolvemos a nossa sociedade. Todos contribuem, seja pelo labor físico, intelectual ou ambos. Já pensou se vivêssemos isolados uns dos outros? Perderíamos várias oportunidades de crescimento. É por meio da relação com o outro e da relação com o nosso trabalho que nós nos tornamos pessoas melhores, menos egoístas e orgulhosas, mais pacientes, benevolentes e caridosas.  E a nossa sociedade? Estaríamos na idade da pedra se não fosse o nosso trabalho. Reparem como evoluímos.

Temos que trabalhar por uma causa maior, seja pessoal ou social. O trabalho só pelo dinheiro perde o seu valor! Eu sei que é difícil pensar assim em uma sociedade consumista como a nossa. Mas mudar é primeiro questão de vontade, segundo, de treino. Para quebrar paradigmas, nada melhor que exercitar a mente! 

Bom, todo esse meu blábláblá é para falar de três exemplos que eu tenho em minha casa, três pessoas que desejam uma vida melhor, com mais conforto, com menos estresse e com mais descanso; mas que fazem do seu trabalho mais que isso, fazem dele uma fonte de amor ao próximo! Essas pessoas são: a técnica Andreia, a cuidadora Anita e o fisioterapeuta Guilherme. Não vou contar nenhuma história específica porque, graças a Deus elas são muitas. Mas posso dizer que muitas vezes eu fico constrangida pelo altruísmo deles, pois eu não sei se seria capaz de fazer o mesmo... Confesso!

Obrigada por fazerem parte da minha vida e por me ensinarem a ser uma pessoa melhor! Não há dinheiro no mundo que pague por isso.  

Beijos,
Dani.

terça-feira, 20 de maio de 2014

QUASE MORTE

Oi pessoal, andei sumida porque tenho passado por maus momentos. No último, passei por uma experiência de quase morte. Foi muito traumático e desesperador!

Comecei a sentir falta de ar e estava com secreção no pulmão. Quando avisei que estava mal, a minha saturação (oxigenação) estava boa, e esse é o problema. Ninguém se importa com aquilo que eu falo, que sinto. Eu não minto. Se falo que estou passando mal é porque estou, mesmo que meus sinais vitais estejam perfeitos. Agir antecipadamente é sempre mais inteligente. Às vezes não é possível trazer a pessoa de volta de uma parada respiratória.

Bem, vamos focar no que senti: não conseguia respirar. Eu estava muito secretiva e, para melhorar, resolveram me nebulizar. Tentaram conectar o nebulizador à máscara do bipap e, para isso, desligaram o aparelho. Fiquei sem oxigênio e sem o fluxo de ar do bipap. Era óbvio que a minha saturação ia cair. Eu não conseguia falar, mas, ainda que discretamente, balançava a cabeça de um lado para o outro para que ligassem o bipap! Só que ninguém me entendeu. Daí, a minha saturação caiu para 72%, tive bradicardia - meus batimentos cardíacos foram para 62bpm, fiquei cianótica,  com pupilas dilatadas, unhas roxas, palidez facial e perda dos sentidos. Voltar a mim foi tão difícil! Exige tanto da gente, do nosso organismo. Voltar exige muito do físico, mas da mente também... a gente tem que querer. Fiquei exausta!

Só tem noção do que é não conseguir respirar quem já passou por isso. Você puxa o ar e ele não vem... o peito dói, você sente o coração sobrecarregado. Desesperador! Teve uma hora que a falta de ar foi tão grande e tão ruim que eu implorei a Deus para morrer logo.

No final das contas, sobrevivi, graças ao meu fisioterapeuta, Guilherme, e minha técnica, Andreia, que agiram utilizando seus conhecimentos. Quando a emergência chegou, mais de três horas depois de ser chamada, eu já estava estabilizada. Guilherme só foi embora depois que o médico chegou, pois é muito comprometido com o trabalho!

Ah! Um ponto importante: a ELA é uma doença que causa fadiga muscular... Até respirar cansa! Imagina então como é cansativo ter falta de ar, fazer ambu, fazer manobras respiratórias e voltar de uma parada respiratória. Depois de um episódio desse, deixe o paciente descansar e se recuperar. Fica a dica!

Beijos,
Dani. 


domingo, 4 de maio de 2014

QUER MOLEZA?

Quer moleza? Espere a morte, porque a vida é dura! Tenho aprendido isso a duras penas. Segundo a religião que professo, estamos aqui para crescermos espiritualmente, apesar de ter gente que acha que veio a passeio. Nada acontece por acaso, então, se estou doente, é por algum motivo. Não culpo ninguém e também não quero ser culpada. Provavelmente, eu tenho muito para evoluir, por isso tanto sofrimento. Mas o aprendizado é coletivo e todos que convivem comigo levam o seu pedacinho de aprendizado. Temos que ser espertos e pegar a parte que nos cabe.

Quanto mais rápido o aprendizado, menor o sofrimento. É difícil! Eu mesma quase sempre não aproveito as oportunidades de crescimento que a vida me dá. Sou humana e erro, só que no meio de tantas coisas, mantenho a minha mente funcionando normalmente. A minha psiquiatra me diz que isso é uma bênção... Não sei... Tenho dúvidas... Mas tenho uma certeza: para não sucumbir, eu preciso do amor daqueles que me amam, principalmente dos meus pais e meu marido.

Para finalizar, cito a personagem de Jack Nicholson no filme Antes de partir : "ai que inveja de quem está tendo um infarto agora!" rsrsrs
 
Beijos,
Dani.

domingo, 27 de abril de 2014

TEMPO E FELICIDADE

Como já disse em outros posts, reforço a importância da doação do nosso tempo para o bem do nosso próximo. É muito gratificante ter pessoas que, de algum modo, dedicam seu tempo a mim e, para que  isso se realize, abrem mão de algo pessoal.

Ontem foi um dia especial. No horário da minha terapia, além da minha psicóloga, Patrícia, vieram minha fonoaudióloga, Margarida, e meu fisioterapeuta, Guilherme. Fazia tempo que eles queriam me levar para passear, e ontem, para a minha surpresa, eles se reuniram aqui em casa para me tirar da cama e me levar para o quintal; afinal, passear era demais para mim, já que fazia meses que eu não saía do quarto.

Confesso que só tomei coragem para sair na cadeira de rodas porque eles estavam aqui. Eu pensei: pôxa, eles estão aqui por mim, mudaram suas vidas por algumas horas por mim, eu não posso decepcioná-los. Fui coagida (risos)! Uma coação do bem! Me senti querida, me senti feliz! Tomei coragem e fui de bip-pap e tudo. O Guilherme me colocou na cadeira com a ajuda dos demais.

Vocês sabem o que aconteceu? FOI BOM DEMAIS!!! Foi bom também ver a expressão de alegria de todos, inclusive do Alkinder e da Gisa, minha cuidadora. Ah, acho que a Margarida, a fonoaudióloga, não ficou 100% feliz porque eu não comi nada (risos).  Calma, uma coisa de cada vez! 

Para completar o meu dia, recebi visitas que amo: Márcia,  Lilian, Elton, meus pais, Isadora, Juliana, Viana, Luciana, Marquinhos, Hallison, meus sogros e Ceiça!

Obrigada a todos que fazem parte da minha vida! Cada um do seu jeito!

Beijos,
Dani.
 
 
 

sábado, 12 de abril de 2014

FAMÍLIA

Sempre vejo nesses programas de TV a cabo que é comum, pela lei da selva, um grupo de animais abandonar um membro que está doente ou ferido. Mas o que mais me chocou foi o vídeo de uma tigresa que abandonou seu filhote porque ele ficou paraplégico após uma briga com outro animal. A mãe ia andando e o filhote gritava (ou chorava) porque não conseguia acompanhá-la. Muito triste! Talvez esse vídeo tenha mexido comigo por causa da minha história. 

Afinal, quantas histórias de pessoas doentes, principalmente idosos, abandonados pelas famílias ouvimos por aí? Muitas, não é? E ouvimos também outras de famílias que cuidam de seus doentes. Como estou nesse meio de home-care, escuto as mais bonitas e as mais tristes histórias. E percebi que ambas são difíceis, mas as bonitas são recheadas de amor.

Como já falei em outro post, se há amor, não há como a vida de uma família continuar a mesma quando um membro fica muito doente! Nem se a doença for simples. Por exemplo: uma cirurgia de joelho simples do meu irmão mobilizou meus pais por duas semanas. Eles tiveram que ir ao Rio de Janeiro, mais especificamente em Resende, para cuidar do meu irmão. Ciúmes? Não! Porque sei que o amor está presente, afinal, somos quatro filhos e temos que dividir os nossos pais.

A minha história é recheada de amor, tenho o amor do meu marido e dos meus pais. Sou privilegiada por ter a presença deles e saber que eles não me abandonarão nunca. Tenho uma estrutura que me atende, e sou grata a Deus por isso. Muitas vezes, fico pensando naqueles que não têm a família por perto e dão sorte quando algum vizinho ou alguém da comunidade ajudam. Porque há pessoas com ELA que não têm nada, nem um olhar carinhoso.

Quando estive em tratamento no HRAN - Hospital Regional da Asa Norte, em Brasília, fiquei sabendo de uma paciente com ELA que era cuidada pela filha de sete anos. Os pais já estavam falecidos, era filha única por parte de mãe e não se dava bem com os irmãos por parte de pai. Morava no fundo da casa da ex-sogra, pois era separada. Ela só tinha a filha, uma menina que foi obrigada a crescer antes da hora, e que fazia tudo pela mãe. A levava ao banheiro, dava-lhe banho e comida, faxinava a casa... Prestava todos os cuidados que deveriam ser feitos por um profissional. Ah, a menina ainda estudava. Quando estava na aula, a mãe ficava na cama, esperando a filha chegar para cuidar dela. Uma história muito triste de uma criança, que por amor, mudou toda a sua vida. E não reclamava, pelo contrário, ela sempre perguntava o que poderia fazer para que a mãe ficasse boa. Coitadinha! Já fazia tanto! Isso faz dois anos e não tive mais notícias.

Não me cabe aqui fazer julgamentos, mas nós vemos muitos adultos que são incapazes de cuidar dos próprios pais, e, por outro lado, vemos a história de uma menininha que abdicou da sua infância pela mãe. Uma mãe cuida de dez filhos, mas dez filhos não cuidam de uma mãe. Bom, há de tudo nessa vida... cada caso é um caso e cada um sabe de si!!! Mas, como estou doente, a minha visão das coisas da vida mudou.

Beijos,

Dani.

sexta-feira, 28 de março de 2014

SER DOENTE

Ontem, uma das minhas cuidadoras deixou que eu colocasse um short de pijama descosturado. Na hora de colocar a roupa, ela viu que o short estava descosturado e não me avisou, nem trocou a roupa. Eu só descobri o fato porque a minha sogra viu e me falou.

Eu fiquei muito brava e triste. Brava, porque a pagamos justamente para isso, cuidar de mim e o seu papel não foi cumprido. Triste, porque quando ela me disse que tinha visto o furo na hora de vestir a roupa e não tinha falado, nem feito nada, eu me senti péssima. Isso porque percebi um desleixo em sua voz do tipo "ela está doente mesmo, pode ficar com a roupa furada".

NÃO, NÃO POSSO!!! Antes de ser doente, EU SOU um ser humano. Não é porque estou acamada que preciso parecer uma mulambo. A minha auto-estima já está baixa, estou deprimida, e não devo ficar bagunçada. Nenhum doente deve! Baseada nessa minha experiência, peço que todos os cuidadores, pagos ou não, técnicos de enfermagem e parentes tenham atenção aos detalhes.  Mantenham a dignidade de seus pacientes. Deixem-nos limpos, com uma roupa boa, cheirosos e penteados.  Ah! Isso é importante... Não temos que ficar descabelados!

Nós agradecemos!!!

Beijos,
 
Dani.

segunda-feira, 24 de março de 2014

O DESAPEGO - Parte II

Não imaginei que o meu texto sobre o desapego fosse mexer tanto com as pessoas. Enfim, a minha intenção era mostrar a minha realidade e os meus sentimentos. Quando escrevo, tento ser a mais verdadeira possível. Como a verdade é minha, ela mexe comigo de maneira diferente. Por isso, eu confesso que não sei dimensionar o impacto dos meus textos nas pessoas. Mas fico feliz em saber que eles provocam emoções tão diferentes.

Continuando com assunto sobre desapego, essa palavra para mim é sinônimo de "não me importar mais": Outro processo difícil. Sempre fui muito exigente e perfeccionista. Todas as minhas coisas tinham que ser perfeitas, como boa virginiana. 

Com a doença, eu tive que tentar me desapegar dos meus perfeccionismos. Por exemplo, cuidei da minha casa até onde pude. Agora, eu simplesmente não me importo mais. Não me importo mais se a casa está suja, se a empregada não sabe passar roupa, se a técnica não sabe fazer minha mudança de decúbito... Eu não falo mais, então, tento não me importar se fui bem limpa, se o banho foi dado direito, se a medicação está certa... difícil demais. Parece que o perfeccionismo se impregna no nosso corpo como perfume ruim. 

Só para ver o nível da coisa... moramos dois anos na França, eu tinha uns quatro anos e, como qualquer criança, aprendi a nova língua rapidamente. Minha mãe conta que eu ficava corrigindo a pronúncia dela. Olha que chata! Como mudar um padrão de comportamento que existiu desde sempre?

Dependo 100% de outra pessoa e, para que eu não sofra, é necessário que eu confie no outro. Para que isso ocorra, é necessário que eu não me importe mais, só que na minha cabeça maluca, não confio em ninguém, nem no meu marido, por melhor que ele ou a minha equipe sejam. Sou privilegiada por ter uma equipe de enfermagem com cinco pessoas que me atendem. Elas são ótimas, super competentes, dedicadas e confiáveis, meu marido também é perfeito, mas eles não sou eu. E eu era imbatível!!! Desculpem a falta de modéstia. rsrss...

E aí, a verdade é que eu não consigo não me importar nem largar totalmente o meu perfeccionismo. Quando o assunto sou eu, eu me importo muito, principalmente se for relacionado ao meu conforto ou a minha qualidade de vida. Tento disfarçar para não ser tão chata, mas eu vejo a verdade, e para sofrer menos, fico quieta, no meu silêncio, sofrendo sozinha. Simplesmente, sei que preciso deixar para lá. Eu tento, eu tento!

Beijos,

Dani.

sexta-feira, 21 de março de 2014

O DESAPEGO

A ELA é uma doença cruel. Por causa dela, fui obrigada a praticar o desapego. O desapego começou com coisas pequenas. Primeiro, tive que abrir mão de lavar louça, fazer os bolos que tanto gostava. Depois, foi a calça jeans que não conseguia abotoar; daí comecei a usar calça de malha. Eu ainda trabalhava e precisava ir ao banheiro sozinha. Daí, a importância de usar uma roupa que eu conseguisse colocar e tirar sozinha. Não conseguia mais tirar a calça, então só usava vestido. Fiquei meses usando só vestido, sapatos abertos que não precisavam prender, os mesmos brincos, não usava bolsa porque não conseguia carregá-la, até parar de andar, depois de respirar e comer, enfim...  Fui abrindo mão da minha vida, de coisas que parecem pequenas, mas que juntas são gigantescas! A prática do desapego era uma constante e foi necessária muita coragem para viver. A cada desapego, uma tristeza. Tento aprender a viver uma vida que tira mais que do que dá.

Eu costumo dizer que por pior que seja, se desapegar de coisas materiais é até fácil quando comparado ao desapego das pessoas. O amanhã a Deus pertence, mas o meu amanhã é certo, só o tempo é incerto. E por isso, eu sofro. Sofro por saber que não acompanharei o crescimento dos meus sobrinhos, que nunca mais irei à casa da minha mãe, sogra e amigos. Quando meu irmão caçula se casar, eu não estarei lá. Sofro pelo sofrimento do meu marido e dos meus pais. Sofro pela vida que escolhi.

Eu não aceito todo esse sofrimento e, por não aceitá-lo, sei que sofro mais, porque sei que a aceitação traria a paz que tanto busco... Por isso não consigo alcançá-la.

Beijos,
 
Dani.

quarta-feira, 19 de março de 2014

SÓ AMAR NÃO BASTA

A doença sempre traz algo de bom. Para mim, ela fez com que me aproximasse de uma religião e acho que comecei bem: fui estudar a doutrina espírita. A doutrina me ensinou muito. Antes, eu achava que o fato de não ser uma pessoa má, já me fazia uma pessoa boa, de bem. Quanto engano!!!

Descobri uma coisa chamada caridade e ainda, que para praticá-la e ser uma pessoa boa, do bem é necessário ação, atitude. Ou seja, nunca pratiquei a caridade. Não tinha tempo!!! Que absurdo! Hoje, eu sei o que é caridade na prática porque tenho pessoas que de estranhas passaram a amigas e dedicam seu tempo a mim.

Acredito que a maior caridade que podemos fazer por alguém é doar o nosso tempo. Poucos somos os que doam um dos nossos bens mais valiosos. Eu não fazia. E agora, que preciso e desejo o tempo do outro, eu percebo que as orações são ótimas e bem vindas, mas só elas não bastam. Ser amada é ótimo, mas, só amar não basta. É necessário ações que na maior parte das vezes são simples.

Um paciente acamado precisa ter a família bem perto, de doçura na voz, de paciência, de nenhuma cobrança, de carinho, de presença, de dedicação do tempo, principalmente. Sei que é difícil para todo mundo, mas se há amor, não há como a vida dos membros da família continuar igual. Isso só acontece onde não há amor, pois a doença é cruel com a família também. Todo e qualquer paciente precisa ser amado, mas o amor sem outras atitudes e sentimentos não basta. Só o amor e a caridade na prática podem salvar um doente de problemas emocionais e até dos físicos. Não há remédio melhor que esses. Nem melhor desabafo para um doente que vive com o som do seu silêncio!

Beijos,
 
Dani.

quinta-feira, 13 de março de 2014

AGRADECIMENTO

Olá pessoal!
Quando fiz o blog, tinha a intenção de compartilhar o meu dia-a-dia e os meus pensamentos malucos de um paciente com ELA. Mais do que isso, a minha pretensão era, além de tentar ajudar alguém, ocupar o meu tempo.

Quanta ignorância e orgulho!  Quem está aprendendo e se emocionando por aqui sou eu. Como não pude ver o óbvio? Era certo que a maior beneficiada com o blog seria eu mesma. Tenho aprendido tanto com cada comentário que me sinto pequena diante da grandeza das palavras de vocês.

Obrigada, obrigada e obrigada!!

Ouso pedir a vocês que continuem a me presentear com suas palavras.

Beijos,
Dani.

quarta-feira, 12 de março de 2014

TRABALHAR É PRECISO

Sinto falta das pessoas inteligentes corporativas. Não sei se alguém da Brasil Telecom Call Center acompanha o blog, mas MORRO de saudade de lá. Até dói. Apesar de toda pressão e todo estresse, eu adorava aquilo. Era movida a desafios e todo dia eu tinha um. A minha equipe era muito unida; não existia sacanagens ou invejas. Todo mundo se ajudava. Mas não era moleza não. A minha coordenadora era dura na queda, às vezes me dava raiva. Depois a raiva passava e eu entendia e concordava com sua postura e seus motivos. Aprendi muito  com ela. E o nossos almoços? Eram memoráveis! Eita povo que gostava de comer bem. Depois disso tudo, ainda tinha o café na Livraria Cultura do Casa Park.

Sinto falta de discutir e, às vezes, até quebrar o pau com o pessoal da área de projetos. Todas pessoas boníssimas. E quando tinha aniversário de alguém de outra equipe, a comemoração quase sempre era no restaurante de comida mexicana que tem no final da Asa Sul - uma região de Brasília. Confesso que nós do RH já estávamos enjoados do restaurante rsrsrs...  mas íamos pelo companheirismo.

À medida que a doença foi piorando, eu tive que me afastar pelo INSS para me tratar. A expectativa era que eu voltasse em um mês, mas sabia que nunca mais voltaria. Depois de alguns meses de licença, tomei a iniciativa e fui buscar as minhas coisas mesmo sem ser provocada, pois eu sabia que seria difícil para a minha coordenadora me ligar e pedir que eu o fizesse. E já que tinha que ser feito, fui  lá e recolhi tudo, com muita tristeza, é claro. Não citarei nomes, para não correr o risco de esquecer ninguém. Trabalhei até o limite e se assim o fiz, foi graças ao pessoal da minha equipe que fazia o papel dos meus braços - colocavam e tiravam o meu casaco, faziam rabo de cavalo no meu cabelo e me ajudavam com o almoço, dentre outras coisas. Serei eternamente grata por isso. 

Sinto-me privilegiada pela oportunidade de trabalhar em um lugar em que realmente gostava. Fui muito feliz lá e isso é o que  importa!!!

Beijos,

Dani.

domingo, 9 de março de 2014

O SOM DO SILÊNCIO

Sempre fui faladeira, daquelas alunas que ficavam o tempo todo conversando em sala de aula. Sempre gostei de falar e de gente. Não foi à toa que me formei em psicologia e fui trabalhar com recursos humanos. Aprendi várias formas de comunicação, mas, a comunicação verbal, pelo menos para mim, é uma das formas mais rápidas e talvez mais eficaz de comunicação.

Desde que nascemos, aprendemos a utilizá-la de modo eficaz. É choro de fome, de manha, de sono e a mãe consegue distinguir todos os tipos de som emitidos pelo seu filho. E assim crescemos, desenvolvendo a fala.

No contexto da minha doença, meu maior medo é a perda da fala. Como seria a minha comunicação? O piscar de olho diante de uma folha de papel com o alfabeto escrito não é suficiente para quem tem tanto gosto e tanta necessidade de fala.

E agora que a minha voz está indo embora, só me sobra o desespero e o som do meu silêncio. Quando tento participar de alguma conversa e as pessoas não entendem o que balbucio, ou quando não consigo falar nada, eu me desespero e percebo que o som do meu silêncio para os outros é somente a ausência de barulho, mas, para mim, o som do meu silêncio é ensurdecedor, pois a minha voz grita e meus pensamentos ecoam em minha mente.

Sobre esse assunto, indico o filme "O Escafandro e a Borboleta". Vale a pena e gostaria de feedback depois!

Beijos,

Dani.

sexta-feira, 7 de março de 2014

COMO SABER?

"Como será o amanhã?
Responda quem puder
O que irá me acontecer?
O meu destino será 
Como Deus quiser
Como será?"
Simone


Sempre fui uma adolescente e uma mulher comportadas. No quesito drogas, rock'n'roll e homens, nunca dei trabalho para os meus pais. Tanto que eu tenho uma prima cuja mãe só deixava a filha sair comigo porque assim achava que ela estaria longe das más influências. Odiava esse rótulo!!! Mas eu era assim. Na minha quadra, era conhecida como a santinha do 101 - número do apartamento onde morava.

Era moça para casar. Eu dizia que queria casar virgem! Hahaha... Nunca fui de beijar muita boca, até porque tinha nojo e medo de pegar herpes.  Só tive dois namorados: com o primeiro, namorei quase sete anos; com o segundo me casei. Nunca fumei maconha ou cheirei lança perfume. Sempre odiei cigarro.

Hoje, deitada nessa cama, eu me ARREPENDO DE TUDO QUE NÃO FIZ. Devia ter beijado mais, depois tratava da herpes, se fosse o caso. Devia ter fumado maconha e  ficado doidona pelo menos uma vez na vida. Imaginem quantas vezes eu poderia ter me apaixonado e me desapaixonado naqueles sete anos de namoro com o meu primeiro namorado! Provavelmente, teria sido mais feliz. Como saber? Na fase de experimentações, eu não  estava experimentando. E agora, que tão jovem perdi a vida, tenho lembranças e saudades de coisas que nunca fiz. E se nunca fiz é porque achava errado. Ah, se eu tivesse coragem, como teria sido? E se eu tivesse sido outra pessoa, teria tido esse fim? Como saber?

Beijos,

Dani

segunda-feira, 3 de março de 2014

QUEM É CAPAZ?

Capacidade, para mim, é a habilidade de produzir algo, muitas vezes ir além do limite. Nós todos somos capazes. Não há limites para o ser humano.

Incapaz é aquele que não acredita em si mesmo. Esse é incapaz mesmo. Pensa pequeno. Como sempre pensei grande, eu sei que sou capaz, apesar de todas as minhas limitações.

Meu cognitivo funciona perfeitamente, todo conhecimento acumulado nesses 37 anos e minhas lembranças estão aqui. E nesse contexto, a paralisia do meu corpo fica em segundo plano, porque com a minha mente eu posso ir longe. Basta querer.

Você que tem alguma limitação, acredite!! Você é CAPAZ! Incapaz é quem não acredita na nossa capacidade.

* não estou levando em consideração a parte jurídica, que me define como incapaz por causa das minhas limitações.

Beijo,

Dani

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Primeiro post

Este é o primeiro post que eu escrevo sozinha sem a ajuda de ninguém, utilizando o computador adaptado.  Isso graças ao meu irmão Fábio, meu pai e meu marido.

Mais um obstáculo superado!!

Abraços,

Dani.  

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

OUTRAS FORMAS

Sinto falta de abraços
Daqueles bem apertados
Que prendem a respiração

Sinto muita falta de abraços
Do abraço do meu marido
Do abraço dos meus pais
Dos meus amigos e meus irmãos

Todavia, a vida, dura como é
Me mostrou que a gente
Não pode ter tudo que quer

E de sagaz que sou
Descobri outras formas
De expressar o amor

Um toque
Um olhar
Uma palavra
Um abraço



Abraços,

Danielle Nepomuceno

sábado, 22 de fevereiro de 2014

O PIRULITO

Dia 28/02 farão dois meses que eu coloquei a GTT. Durante esse período, a minha fonoaudióloga tem me incentivado a experimentar novos sabores. Uma vez ou outra, eu como papinha de bebê, bebo suco, tomo sorvete. Não é nada fácil, porque eu tenho medo de engasgar e broncoaspirar *. Não sei se é assim com todo mundo que se encontra em situação parecida, mas meu paladar mudou: o doce é mais doce, o amargo mais amargo... Todos os sabores ficaram mais acentuados e tornou-se impossível tomar um suco de limão, que chega  a azedar até a testa.

Faz algumas semanas que a fono tem insistido para eu chupar um pequeno pirulito, assim, eu posso estimular a deglutição. Hoje, resolvi chupar o tal pirulito, algo tão infantil, mas que foi muito difícil para mim. Além de não ter toda a musculatura da boca funcionando, eu desaprendi a chupar um simples pirulito. Juro, ele era pequeno, mas quando foi para a minha boca, se transformou em um gigante. Fiquei tensa, com falta de ar, mas, pelo menos, eu tentei. Chupei o pirulito quase todo. Quem sabe, da próxima vez, eu consiga terminá-lo.

Todo dia eu tenho algo a superar que pode parecer pequeno, mas é enorme para mim. Por hoje, o pirulito foi mais um obstáculo superado! Vamos ver quais serão os próximos, e se eu terei coragem de chupar outro.

Um beijo especial à minha fonoaudióloga, Margarida, que me aguenta três vezes por semana. 

Beijos,

Dani

* Broncoaspiração - clique para saber mais

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

A INVEJA MATA?

Quando a gente tem consciência da morte, a gente quer resolver todas as pendências antes de partir. Hoje eu vim confessar que eu tive inveja de verdade, daquela que mata, mas por uma única vez na minha vida. Eu e o Alkinder sempre quisemos ter filhos e, em 2008, resolvemos tentar um. Em novembro daquele ano,  no mesmo dia que eu descobri que estava grávida, entrei em processo de aborto. Como os sintomas da minha doença começaram na mesma época, resolvemos esperar até descobrir o que eu tinha. Eu acho que foi mais difícil para o Alkinder do que pra mim. Eu queria ser mãe, mas eu acho que ele queria mais ainda ser pai. Tivemos que superar esse problema e eu demorei muito a entender a vontade de Deus. Nós dois, além de sermos os filhos mais velhos, fomos os primeiros a casar. Na teoria, teríamos que dar os primeiros netos às nossas famílias.

Com o passar do tempo, eu fui piorando da doença, mas um filho ainda era um sonho. Daí, no dia dos pais de 2011, a Amanda, irmã do Alkinder, chega com a notícia de que estava grávida. Como assim? A inveja tomou conta de mim! Eu tinha que ter tido filho primeiro, e Deus, com a doença que havia me imposto, tinha me tirado a oportunidade. Eu nem conseguia olhar para ela, e me vinha na cabeça a minha doença, o aborto, e tudo mais.

 Em dezembro do mesmo ano, no aniversário do Alkinder, ela e o Thiago, o pai, nos convidaram para sermos padrinhos do bebê. Ali, algo se quebrou, e eu, que já me sentia tão mal, fiquei pior ainda por invejar uma pessoa que eu gostava. Ela, mesmo considerando que eu estava doente, em um gesto carinhoso, me chamou para ser madrinha do filho dela. Nesse momento, a inveja foi embora e, de repente, me veio o sentimento de amor por aquela criança. Não sei se o convite foi porque eu sou casada com o irmão dela, pois eu achava que uma prima muito querida da Amanda fosse ser a madrinha, como, de fato, foi madrinha de consagração. 

Enquanto eu pude, me fiz presente, e até ajudei a organizar o chá-de-fraldas, mas hoje, para mim, a Lívia é a madrinha de verdade, porque ela se faz presente. Eu acho que o convite veio pra mim porque sou casada com o Alkinder, afinal  o que eu posso oferecer ao Otávio? Mas agora, isso não importa. Na verdade, nunca importou! O que importa foi a preocupação, o gesto de atenção e carinho que ela teve comigo.

Eu descobri que a inveja é um pecado capital e, segundo a fé católica,crença professada pela a Amanda, essa prática é condenável . Por isso, todas essas palavras são para pedir perdão à Amanda e ao Otávio, pessoas que aprendi a amar, e, o pequeno, amo como se fosse um filho. 

Graças a Deus, eu descobri, a duras penas, que a inveja não mata!

Beijos,

Dani

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

O HOMEM QUE ERA SÓ UMA CABEÇA

desconheço o autor, mas o texto foi retirado
do grupo do Facebook "Pró-Cura da ELA"

Os dias foram passando, depois meses e anos, foi quando ele percebeu que morava apenas em uma cabeça. Não que não tivesse membros e os outros órgãos imprescindíveis à vida. Ele os possuía, mas não detinha o controle de nada. Pouco? Pode ter sentido que sim, mas logo percebeu que tinha que fazer de sua nova morada um palácio que captasse e distribuísse riqueza. Um desafio. Sabia que seria preciso muita transpiração, sair da zona de conforto, deixar de morrer em paz e lutar pela vida a todo instante. Mas ele sabia que só podia contar com uma cabeça.

Queria viver plenamente, pois possuía mania de grandeza, por isso mergulhou nas profundezas das emoções e do imaginário. Também contou com as ajudas imprescindíveis do mundo virtual e de pessoas que zelavam por sua saúde vinte quatro horas por dia. 
Mas era apenas uma cabeça que ousou e desafiou o sabor da vida. Não sei onde buscou tanta inspiração. Só sei que tinha, e deve ter sido nas suas doces lembranças, a maioria, guardadas na meninice e na riqueza cultural e social de sua adolescência. Realmente cumpriram o papel de ser a estrutura da sua personalidade.

Os amigos que fez e insiste em continuar fazendo e a família, multiplicavam sua capacidade de influenciar e ser influenciado, fortalecendo o espírito. 
Por incrível que possa parecer, agradecia a Deus todos os dias o fato de não possuir uma daquelas doenças que desabita a cabeça, afinal investiu tanto em SER, que seria muito doloroso assistir tudo se perder. Sua grande jornada era provar para si mesmo e para outros que seria possível ser feliz e produtivo mesmo habitando uma só cabeça. Lutou tanto, as vezes via suas forças, que já eram poucas, se exaurirem, mas não desistiu, nunca tivera desistido antes em sua vida.

Então ele fechou os olhos e se imaginou em um grande salão de baile, com um enorme lustre de cristal importado, e ouvindo o tango de Carlos Gardel, "Por una cabeza", delirou e dançou, e dançou... http://www.youtube.com/watch?v=BHunor1B3xU

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Meus comentários desse texto serão feitos em outro post, quando eu me recuperar do trauma de que eu sou só uma cabeça.

Beijos,

Dani

sábado, 15 de fevereiro de 2014

A ESPERANÇA

"Cada passo, por menor e mais lento que seja, já tira você do lugar. Já faz com que tenhas uma nova perspectiva da vida. Não pense que um pequeno esforço não vale de nada. É a união de pequenos acontecimentos que faz grandes histórias. "
Aryane Silva

Inspiração para um mau dia e uma vida difícil.
Beijos,
Dani


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

NINA

Nina Rosa, minha cachorrinha de estimação, uma boxer de três anos e meio, é uma fofura, meiga, dócil e adora gente. As pessoas quando chegam aqui em casa se assustam com seu tamanho, mas logo ela conquista o coração de todas, até das mais sisudas. Ela tem um remelexo todo especial e, se fica feliz, se balança toda. Adora todos que trabalham aqui, e também das visitas que recebo com frequência. Anita, Gisa e Jussara (minhas cuidadoras), além de me auxiliarem, também ajudam a cuidar um pouco da Nina.

Nessas últimas férias, as minhas sobrinhas perderam o medo dela, principalmente a Bianca, a mais nova. Luiza ainda ficou um pouco receosa, principalmente depois do empurrão que tomou da Nina. As duas perguntavam incessantemente a respeito da rotina da cadela. Onde ela faz xixi? Quem limpa o bumbum dela? O que são essas bolinhas (referindo-se as mamas)? Depois que descobriram que a Nina faz cocô na grama, não quiseram mais pisar por lá! E Luiza concluiu por si que ninguém precisa limpar o bumbum dela porque o buraco é grande.

Quando a Nina chegou aqui em casa em agosto de 2010, eu me apaixonei a primeira vista. Aquela bolinha de pelanca fez meu coração amolecer! Como eu ainda não estava tão debilitada, conseguia rolar com ela no chão, brincar de pega-pega e, quando eu sentava em posição indiana, ela aninhava-se em minhas pernas. Dentre essas brincadeiras, uma das preferidas da Nina era pular sobre minhas pernas. Imaginem que um dia ela ela mordeu meu short e puxou até conseguir tirá-lo! Eu não consegui oferecer resistência porque já não tinha força nas mãos.

À medida que ela foi crescendo, o meu amor foi aumentando. Não tenho filhos, mas ouso dizer que o que sinto por ela é infinitamente grande, incondicional, e talvez se pareça ao amor de mãe para com um filho.  Aqui em casa, a Nina não é só um cãozinho de estimação, mas faz parte da família. Ela é nossa filha! 

Ela me ajuda muito com o processo terapêutico, o que me leva a ter a opinião que se todo doente grave tivesse um bichinho de estimação, seja ele qual for, a sua qualidade de vida seria bem melhor. Quando eu encosto em seu pelo, eu sinto a sua maciez,  eu me sinto muito feliz e realizada. Parece que os problemas somem. E quando ela lambe meu rosto, é uma alegria só.

Ela se preocupa tanto comigo que na primeira vez que fui para a cadeira de rodas ela não gostou. Ficava pulando e chorando em volta de mim e só se satisfez quando saí da cadeira. Durante as minhas internações, ela fica em casa muito triste, Alkinder conta. Na última, que eu fui de ambulância, ela pressentiu que algo estava errado e ficava correndo pela casa e chorando.

Ela é tão especial que eu costumo brincar que na próxima encarnação ela vai vir como ser humano, de tão esperta que é. E de tão esperta, ela sabe que só pode entrar em casa quando o Alkinder não está, porque sabe que ele não permite. Basta o portão fechar com a saída dele que ela vira a dona da casa. Ultimamente, ela tem dormido comigo em meu quarto. Dorme tão profundamente que até ronca. Mas quem será mesmo que toma conta da casa?

Eu tenho uma teoria baseada no meu achismo: quem não gosta de cachorro ou boa pessoa não é, ou não teve a oportunidade de conviver com um. Se eu não estivesse doente, eu teria pelo menos mais dois bichos. A Nina é meu primeiro animal de estimação e veio muito tarde em minha vida, mas a tempo de contribuir para minha felicidade.

minha casa, setembro de 2010

Beijos,

Dani

domingo, 9 de fevereiro de 2014

VERDADE

Percebi que meu último post não deu muito Ibope. As pessoas podem ter ficado chocadas, impactadas ou terem achado um absurdo o que leram. Mas essa é a minha verdade, e quem me conhece, sabe. Prefiro a mais amarga verdade que a mais doce mentira. Não sou mulher de meias-verdades. Por exemplo, se o meu marido faz uma comida e me pergunta se está boa, e eu achar que está ruim, eu falo mesmo para ele que está ruim. Ele fica um pouco chateado, mas, com a minha verdade, eu estou dando a ele a oportunidade de melhorar o prato.

O que me incomoda são as mentiras sociais que são impostas diariamente. Uma vez, durante a minha aula de pós-graduação, um grupo fez uma apresentação medíocre sobre um determinado assunto. Ao final, o professor veio em minha direção e me perguntou o que achei. A minha sorte foi que a colega ao lado se antecipou e disse que o trabalho tinha sido ótimo. No intervalo, eu e meus colegas mais próximos rimos muito, porque todos sabíamos que o trabalho tinha sido ruim e que eu falaria a verdade. Daí a necessidade da mentira social. Se eu tivesse falado a verdade, eu seria odiada pela turma.

Em outra ocasião engraçada, como de costume, falei a verdade. Eu e Alkinder estávamos saindo há pouco mais de um mês e fomos ao encontro de um casal de amigos dele no La Massas, um restaurante no Lago Sul, em Brasília. Esse amigo nos perguntou se estávamos namorando. Enquanto eu balançava a cabeça negativamente, o Alkinder dizia "sim", o que o deixou todo constrangido. Ora, nós ainda não estávamos namorando e ele nem havia feito o pedido oficial! Pouco tempo depois, ele me pediu em namoro e enviou por e-mail a canção Minha Namorada, de Vinícius de Moraes, canção essa que escolhi para meu cortejo de entrada na igreja durante nosso casamento. Depois de mais de dez anos do pedido de namoro, ainda me emociono com essa música, e acho que valer a pena ouvir. (Clique aqui para ouvir.)

Enfim, acho uma hipocrisia a sociedade nos impor as mentiras sociais. Crescemos despreparados para a vida, pois na nossa sociedade, ser sincero e verdadeiro é considerado falta de educação. No fundo, percebo que somos criados para nos sentirmos ofendidos e magoados quando a verdade não nos é conveniente.

Beijos,

Dani

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A GASTROSTOMIA

No post anterior, eu falei como havia passado mal após o procedimento da gastrostomia (GTT). Agora vou contar da minha vida, ou melhor, da  prisão que ela se tornou depois disso. Eu fui iludida de que a GTT funcionaria como um "arroz com feijão", e continuaria tendo o prazer de comer só coisas gostosas pela via oral.

Comecei a receber a dieta pela sonda pelo chamado sistema fechado, no qual eu ficava conectada 24 horas por dia à bomba de infusão. Por uma semana, a coisa funcionou dessa forma, me causando diarreia, o que era muito humilhante. Já não bastasse ter um estranho limpando a minha bunda, era difícil controlar a vontade e eu acabava sujando tudo ao meu redor. Além disso, eu sentia uma mistura de raiva e tristeza vendo aquela sonda de silicone de aproximadamente 20cm presa à minha barriga.

Depois de uma semana, iniciei o uso do sistema aberto. As coisas começaram a melhorar um pouco e a diarreia ficou mais controlada. A partir de então, só fico conectada ao aparelho de infusão para receber a dieta em horários pré-definidos, mas continuo me sentindo em uma prisão.

Privacidade e intimidade são coisas que não fazem mais parte da minha vida. Nem sequer meus pais, que me visitam diariamente, acompanham a rotina de higiene pessoal do meu dia-a-dia. Aliás, acho que ninguém imagina com é a intimidade de um paciente acamado. Quando as pessoas chegam, eu estou limpinha e cheirosa para que elas possam usufruir dos melhores momentos comigo.

Vocês nem precisam dizer que a GTT foi melhor pra mim, que vou ganhar peso, receber novos nutrientes... Diante de tudo isso, pergunto: até que ponto esse novo conceito de alimentação aumenta a qualidade de vida do paciente ou somente prolonga seu sofrimento? (assunto para outro post)

Ainda assim, sou grata às cuidadoras, que tratam de mim 24 horas por dia.

Beijos,

Dani

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A morte e o morrer

A "morte" e o "morrer" nem sempre andam juntos, pelo menos na minha opinião. A morte parece-me mais abstrata e fala-se nela como se fosse algo muito distante. Morrer é mais concreto, algo com ação, e comenta-se dele com receio e tristeza, pois ninguém quer morrer.

Eu acho, na verdade, que o perigo está quando a morte e o morrer se juntam. Aí, amigo, já era, porque quando chega a nossa hora, não tem mais jeito de escapar. Eu confesso que, na maior parte do tempo, penso na morte como um desejo, e acho egoísmo daqueles que rezam pedindo para uma pessoa com doença grave e incurável continuarem a viver a qualquer custo. Aposto que o céu é bem melhor que a terra! Por que não nos deixam ir para lá?

Apesar do meu desejo de morte, eu tive duas experiências que me mostraram que o conceito de morte é muito diferente de morrer. A primeira foi quando tive um desmaio em casa por falta de ar. Nos poucos minutos que se passaram, eu lutei para viver, mesmo desejando a morte. Fui afetada por uma atelectasia pulmonar (1), em que os meus alvéolos pulmonares haviam colabado. A segunda experiência foi bem pior. Ocorreu quando acordei da gastrostomia (2) com a boca e garganta cheias de saliva e secreção e não conseguia respirar. Foi desesperador! O sedativo que tomei enfraqueceu mais ainda meus pulmões. Lutei muito para não morrer, e depois de tudo o que passou, eu fiquei me perguntando o porquê de não ter deixado a morte me levar, considerando que não havia me entregado.

Me dei conta de que eu havia vivenciado umas das mais sublimes experiências animais: o instinto da luta pela sobrevivência. No fundo, eu acho que ninguém quer morrer de verdade.

Tudo isso me lembra um conto: "Quem quer ir para o céu?" - pergunta o padre - e todos levantam a mão. "Quem quer morrer?" - indaga novamente - e ninguém se manifesta. Ora, mas não é só morrendo que a gente vai para o céu, me pergunto!

Somente depois desses acontecimentos eu descobri que, apesar de desejar a morte, eu não quero morrer.

Beijos,

Dani

(1) Atelectasia Pulmonar 
(2) Gastrostomia

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Amor

A relação entre pai e filho mostrada no final da novela, me lembrou muito o filme "Os intocáveis'". O filme fala sobre a relação entre um tetraplégico e o seu cuidador. Eles eram intocáveis porque cada um vivia em seu casulo, amargurados. A medida que, a relação foi evoluindo, eles foram se modificando e se abrindo pra vida.  Baseando-me, somente na relação pai e filho e esquecendo as baboseiras da novela, o Felix e o César também viviam num casulo que só foi se abrindo quando o filho foi cuidar do pai doente.

Enfim, confesso que me emocionei com o final da novela. Provavelmente, porque eu acredito que a doença modifica as relações, normalmente para melhor; mas, também para pior.

Beijo,
Dani.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Felicidade

 Eu acredito que a felicidade completa não existe; o que temos são momentos de alegria e tristeza também.Rubem Alves diz que a felicidade vem sempre embrulhada num papel fino de tristeza. Não adianta fugir. Eu aprendi que temos que ser gratos a infelicidade porque só passando por momentos difíceis é que aprendemos a valorizar os momentos de alegria. Quando as minhas sobrinhas chegam aqui em casa e me dão um beijo e um abraço, mesmo muito doente, eu me sinto a mulher mais feliz do mundo.
Um abraço,
Dani

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O DIAGNÓSTICO

Como já explicado na primeira postagem, passamos por vários especialistas em Brasília, e não encontramos respostas. Nossa neurologista da época sugeriu que fôssemos a São Paulo em busca de uma opinião. Na verdade, eu acho que ela sabia qual era a minha doença, mas por ser muito amiga dos meus tios, faltou-lhe coragem para nos contar.
Eu e Alkinder chegamos a São Paulo muito apreensivos, e fiz mais um exame de eletroneuromiografia (clique aqui para saber mais sobre o exame). A combinação entre o exame clínico e o eletroneuromiográfico não deixaram dúvidas àqueles médicos de que era Esclerose Lateral Amiotrófica. Nessa altura do campeonato, eu já havia pesquisado tudo sobre essa doença, e o anúncio do diagnóstico foi como receber uma sentença de morte! Deixei o consultório completamente atordoada. Sentei no meio-fio da calçada e chorei, chorei muito e pensava quanto tempo de vida eu ainda teria.
No dia seguinte, eu, psicóloga, sem perceber, me afundei na fase de negação do luto. Fomos conhecer a Rua 25 de março onde fizemos muitas compras e voltamos a Brasília. Chegando, eu parei com a fisioterapia por um ano e não tinha acompanhamento psicológico. Mesmo com os membros superiores comprometidos, eu não queria saber da doença e não era acompanhada por especialista particular, tudo porque me recusava.
Como no começo da minha doença não se percebia tanta evolução, hoje, eu penso que toda a minha família entrou em nesse mesmo processo de negação, pois eles não insistiam para que eu voltasse para a fisio e nem procurasse um especialista particular ou apoio psicológico.
Comecei a pesquisar frequentemente sobre passagens aéreas baratas para conhecer novos lugares. Conheci Maceió, Salvador, Teresina, Parnaíba, Foz do Iguaçu e Manaus, além de ir várias vezes ao Rio de Janeiro visitar meus irmãos. O processo de luto é difícil porque é imperceptível para quem está vivenciando-o. Com tantas viagens, se não fosse a necessidade de ajuda, eu estaria no paraíso.
Abraços,
Dani
fonte: http://www.luzparacorpoeespirito.com

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Lembranças esquecidas

Oi Pessoal,

Lendo os comentários, eu fiquei muito emocionada. Eu havia esquecido que a minha risada era minha marca registrada. Quantas lembranças esquecidas, como era bom gargalhar. Hoje eu me dei conta de que a doença tirou isso de mim - as gargalhadas e as lembranças que hoje foram retomadas.

Beijos,
Dani


domingo, 26 de janeiro de 2014

Limitações

Pessoal,
Estou adorando todos os comentários! Gostaria de responder a todos, mas minhas limitações não permitem. Posso garantir que a cada comentário lido, novas emoções e velhas lembranças vão surgindo, e isso me faz muito bem!
Da mesma forma, ainda não estou certa sobre a quantidade e periodicidade das publicações no blog. Dependendo da densidade emocional e da extensão do texto, é possível que eu leve muitos dias para escrever. Por esse motivo, preciso contar com a paciência de vocês!
Um beijo,
Dani

sábado, 25 de janeiro de 2014

Para começar - Parte II

Pessoal, agradeço as palavras de incentivo e também as bênçãos.
Peço paciência com o blog, pois ainda não tenho a habilidade com o computador adaptado que consegui emprestado. Depois dou mais detalhes a respeito dessa máquina.

Quero dedicar este blog ao meu marido, que cuidou de toda a parte técnica, e aos meus pais, por terem batalhado pelo equipamento.
Sou uma pessoa forte e determinada, mas não tenho intenção de ser exemplo para ninguém, porque sou humana e tenho muitos momentos de fraqueza em que perco a minha fé. Espero que gostem do blog e que ele tenha alguma utilidade real.

Abraços,

Dani

(Esperando, eu espero no Senhor!)

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Para começar...

     Dani me pediu para inaugurar seu blog com algo por mim (Alkinder) escrito. Me restringi todavia a uma breve contextualização. Fato é que a Dani ainda está se readaptando aos meios tecnológicos depois de longo inverno sem internet, facebook, e-mail... Há muito ela havia me pedido para viabilizar o espaço, mas somente agora ela reuniu forças necessárias para ir avante com o projeto. Creio que a intenção da nossa nova blogueira é levar ao mundo as rotinas, dificuldades e ideias de um portador de Esclerose  Lateral Amiotrófica (ELA), além da troca de experiências e o resgate da interação com o que há fora dos limites de nossa casa.

    Até o fim de 2008, tínhamos a vida normal de dois anos e alguns meses de casados, com planos de viagens, casa, e, dentre outros tantos, filhos. Tínhamos naquele ano retornado de uma fantástica experiência de morar no Mato Grosso do Sul, terra que aprendemos a amar e onde conquistamos muitas amizades. No entanto, a forma como hoje vivemos decorre de um mal que acometeu a Dani cujos primeiros sintomas se manifestaram no fim desse mesmo 2008. Inicialmente, a doença impunha somente fraqueza em umas da mãos, o que levou alguns médicos tratarem uma suposta tendinite. Foi ainda suscitada a síndrome do Túnel do Carpo, sendo tudo descartado quando algum iluminado descobriu que o problema era neurológico, não ortopédico.

    Após a peregrinação por alguns especialistas de Brasília e a realização de vários dolorosos exames de eletroneuromiografia, deu-se início a um tratamento com imunoglobulina, havendo uma suspeita inicial de Neuropatia Motora Multifocal. Em um intervalo de aproximadamente seis meses, foram administrados três ciclos do medicamento, cada qual em uma semana de internação. O tratamento afigurou-se praticamente inócuo, não houve efeitos colaterais, exceto por forte dor de cabeça. Apesar do resultado, persistiu a dúvida sobre o diagnóstico, quando fomos aconselhados pela própria médica assistente a procurar ajuda em São Paulo.

     Em fevereiro de 2010, recorremos a um renomado neurologista na capital paulista que, após alguns exames, reduziu o diagnóstico à tão temida ELA. Nesse período, ambos membros superiores estavam com a musculatura muito comprometida. De volta ao DF, iniciamos tratamento no Hospital Sarah Kubitscheck por volta de maio de 2010. Novamente, por dúvidas dos médicos com relação ao diagnóstico, foram realizadas novas investigações e, mais uma vez, administrados três ciclos de imunoglobulina, ainda na esperança de se obter diagnóstico menos gravoso. Novamente o tratamento não apresentou resultados significativos. O quadro continuou a evoluir e o comprometimento dos membros superiores emergia com total intensidade. Em fevereiro de 2011 estivemos na Bahia, onde ela foi examinada por mais um magnífico especialista, o qual corroborou o diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica.

     Ao fim de 2011, o quadro era de severa atrofia dos membros superiores e médio comprometimento dos membros inferiores, motivo pelo qual deambulava com muita dificuldade. Muitas quedas houve nesse período e vários ferimentos por conseguinte. Tentando atacar o mal de todas as formas, conseguimos com que fosse, em meados de 2012, admitida em um bom programa de acompanhamento do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN) em Brasília, onde seguiu tratando-se por quase um ano. Por óbvio, já tínhamos consciência nesse momento que qualquer tratamento era para dar suporte às demandas periféricas, e não para a doença em si, que, infelizmente, é incurável e sequer pode ser controlada. Logo evoluiu para uma cadeira de rodas com falhas no controle de tronco e pescoço, respiração, deglutição e fala. A reboque vieram outros problemas, como trombose, dispneia e pequenas instabilidades cardíacas.

     Está aposentada por invalidez desde maio de 2011, período que também remonta um quadro depressivo para o qual também faz tratamento e administra várias drogas. O quadro atual é de tetraplegia, sem controle de tronco e pescoço, depressão profunda, respira com ventilação auxiliar (bipap), alimenta-se por meio de sonda gástrica e fala pouquíssimo com enorme esforço. Está assistida desde o início de 2013 pelo home-care do plano de saúde com equipe multidisciplinar composta por médico, enfermeiro, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e nutricionista. Além das técnicas de enfermagem da assistência domiciliar que a acompanham diuturnamente, temos também as cuidadoras que diretamente contratamos para auxiliar nas atividades.

     Nossa casa hoje funciona com vistas ao melhor conforto possível à minha Dani, que, não obstante todas as minhas humanas dificuldades, sempre vai poder contar com meu amor. Não menos importante, contamos com o incansável suporte da família e de bons amigos. Ainda, nos exercitamos para depositar em Deus nossa fé, rogando por resignação e coragem para vencer cada dura e sofrida batalha diária. Em que pese meu desgaste emocional em descrever esse pedaço da história da Dani, torço para que ela realmente leve adiante sua inicial proposta para este espaço.

    Fraternal abraço a todos,

    Alkinder